sexta-feira, 31 de março de 2023

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

38. Sexta-feira depois do I domingo da Paixão: A compaixão de Nossa Senhora

sexta-feira da I semana da Paixão

"E uma espada trespassará a tua alma" (Lc 2, 35)
Estas palavras assinalam a grande compaixão de Nossa Senhora pelo Cristo.
Quatro coisas tornaram a Paixão de Cristo sobretudo amargas à mãe de Cristo:
1. A bondade de seu Filho: "ele não cometeu pecado, nem se encontrou engano na sua boca" (1 Pd 2, 22);

2. A crueldade dos verdugos, que se evidencia ao terem se recusado a dar-lhe água na sua agonia e impedido que lho desse sua mãe, que diligentemente daria.

3. A ignomínia do suplício. "Condenemo-lo a uma morte infame", diz o livro da Sabedoria (2, 20).

4. A atrocidade dos tormentos: "Ó vós todos que passais pelo caminho, atendei e vede se há dor semelhante à dor que me atormenta"(Lm 1, 12).
Serm. Quanto às palavras do velho Simeão: "uma espada trespassará a tua alma", Orígines e outros doutores as aplicam à dor sofrida por Cristo na Paixão. Quanto a Ambrósio, pela espada entende significar a prudência de Maria, não ignorante do mistério celeste. Pois, vivo é o verbo de Deus, válido e mais agudo que toda espada de dois gumes. Outros, porém, entendem por isso a espada da dúvida, não devendo, porém, entender-se por esta uma dúvida culpável contra a fé, mas a da admiração e da discussão. Assim diz Basílio: a Santa Virgem, aos pés da cruz e presenciando tudo o que se passou, depois mesmo do testemunho de Gabriel, depois do inefável conhecimento da divina concepção, depois da ingente realização dos milagres, flutuava na sua alma, vendo, de um lado, as humilhações que sofria seu Filho e, de outro, as maravilhas que realizava. IIIa q. XXVII, a. IV, 2um
Mesmo sabendo pela fé que Deus queria que Cristo sofresse, e ainda que conformasse sua vontade à vontade divina quanto à coisa desejada, como fazem os perfeitos, a Virgem Maria se entristecia pela morte de Cristo, enquanto sua vontade inferior repugnava esta coisa particularmente desejada; e isto não é contrário à perfeição.
1 Dist. 48, q. única, a. III
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 31  -  Jesus nos concede favores porque é bom e porque nos ama, não porque merecemos.

quinta-feira, 30 de março de 2023

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

37. Quinta-feira depois do I domingo da Paixão: O Sinal maior do amor de Cristo

quinta-feira da I semana da Paixão

Aparentemente, a maior prova do amor de Cristo por nós foi o ter dado seu corpo como alimento, e não o ter sofrido por nós, pois a caridade da Pátria é mais perfeita que a caridade da Via. Ora, este benefício com que Deus nos agraciou, ao nos dar seu corpo como alimento, é mais similar à caridade da Pátria, onde gozaremos plenamente de Deus, enquanto a Paixão a que Cristo se submeteu mais se assemelha à caridade da Via, onde nos expomos a morrer por Cristo. Assim, pois, a maior prova de amor de Cristo seria o ter nos dado seu corpo como alimento, e não o ter sofrido por nós. Contudo, lemos no Evangelho (Jo 15, 13): "Não há maior amor do que dar a própria vida pelos seus amigos".

Solução: No que diz respeito ao amor humano, nada ultrapassa o amor com que nos amamos a nós mesmos, por isso este amor é a medida de todo amor que sentimos pelos demais. Ora, o característico do amor com que nos amamos a nós mesmos, é o querer o bem a nós mesmos. Portanto, o amor ao próximo será tanto mais evidente quanto mais preterirmos em seu proveito o bem que desejamos para nós, como aquilo das Escrituras (Pr 12, 26): "Aquele que por amor do seu amigo não repara em sofrer alguma perda, é justo". Ora, o homem quer para si mesmo um triplo bem particular: sua alma, seu corpo, os bens exteriores. Suportar algum prejuízo nos bens exteriores por causa de outrem é sinal de amor. Sofrer corporalmente por outrem, em trabalhos ou agressões, é sinal ainda maior de amor. Contudo, abandonar sua alma e morrer pelo amigo, eis o sinal máximo de amor. Assim, ao sofrer e morrer por nós, Cristo nos deu a maior prova de seu amor. Ao nos dar seu próprio corpo como alimento, o fez sem nenhum detrimento próprio. A Paixão é a maior prova do amor de Deus. Por isso a Eucaristia é memorial e figura da Paixão de Cristo. Ora, a verdade se superpõe à figura e a realidade, ao memorial. A produção do corpo de Cristo no Santo Sacramento é figura do amor com que Deus nos ama na Pátria; mas a Paixão de Cristo pertence ao amor mesmo de Deus, que nos tirou da perdição para nos levar a si. O amor de Deus não é maior no céu que no presente.
Quodl. V, q. III, a. II.

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

 Dia 30  -  Lembre-se de que não se vence batalhas sem a oração.

quarta-feira, 29 de março de 2023

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

36. Quarta-feira depois do I domingo da Paixão: O Sepulcro Espiritual *

quarta-feira da I semana da Paixão

A contemplação das coisas celestes é representada pelo sepulcro. Por isso, sobre a passagem das Escrituras (Jó 3, 22): "e ficam transportados de alegria, quando encontram o sepulcro?", comenta são Gregório: na contemplação das coisas divinas, a alma, morta para o mundo, esconde-se como um corpo na sepultura e, longe de toda inquietação do século, repousa por três dias como que por uma tripla imersão. Os atribulados e vexados pelos insultos dos homens, ao entrar em espírito na presença de Deus, não mais se sentem atribulados, conforme aquilo do salmista (Sl 30, 21): "Sob a proteção do teu rosto os defendes das conjuras dos homens". Três coisas são necessárias para este sepulcro espiritual em Deus: que a alma pratique as virtudes, torne-se toda pura e branca e morra radicalmente para o mundo.Todas estas condições se encontram misticamente presentes na sepultura de Cristo.
1. A primeira encontramos em são Marcos (14, 8), no lugar em que se diz que Maria Madalena embalsamou com antecipação a sepultura de Jesus: o balsamo precioso de nardo significa as virtudes que possuem grande preço. Nada nesta vida é mais precioso que as virtudes. Por isso, a alma santa que quer ser embalsamada na divina contemplação, deve antes de mais nada receber o balsamo pelo exercício das virtudes. Assim dizia Jó (5, 26): "Entrarás, na maturidade, no sepulcro..." — a que acrescenta a Glosa: da divina contemplação — "...como um feixe de trigo colhido a seu tempo." — novamente a Glosa: porque o tempo da ação tem por recompensa a eterna contemplação; e é preciso que o perfeito exercite antes sua alma nas virtudes para guardá-la em seguida no celeiro do repouso.

2. A segunda encontramos também em são Marcos (15, 40), no lugar em que se diz que José comprou um sudário, pois o sudário é uma peça de linho, e o linho só se embranquece com muito trabalho. Daí vêm o simbolizar a candura da alma, à qual só conquistamos com muito trabalho. Lê-se no Apocalipse (22, 11), "aquele que é justo justifique-se mais; aquele que é santo, santifique-se mais". São Paulo dizia aos romanos (6, 4): "Nós fomos, pois, sepultados com ele, a fim de morrer pelo batismo, para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos pela glória do Pai, assim nós vivamos uma vida nova", progredindo do bem ao melhor, pela justiça da fé, na esperança da glória. Assim, devem os homens guardarem-se no sepulcro da divina contemplação pelo candor da pureza interior. Por isso, sobre aquilo da Escritura (Mt 5, 8): "Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus", disse são Jerônimo: o Senhor, que é puro, é visto pelo coração puro.

3. A terceira encontramos em são João (19, 39), quando diz "Nicodemos, o que tinha ido primeiramente de noite ter com Jesus, foi também, levando uma composição de quase cem libras de mirra e de aloés". As cem libras de mirra e de aloés, pelas quais o corpo morto conserva-se sem se corromper, significam a mortificação perfeita dos sentidos exteriores, pela qual a alma, morta para o mundo, conserva-se sem se corromper pelos vícios; segundo esta palavra de são Paulo (2 Cor 4, 16): "embora se destrua em nós o homem exterior, todavia o homem interior vai-se renovando de dia para dia", ou seja, torna-se cada vez mais puro de vícios pelo fogo da tribulação. Por isso, a alma do homem deve, antes de mais nada, morrer para este mundo com Cristo e, sem seguido, ser sepultada com ele, no segredo da contemplação. São Paulo o dizia aos Colossenses (3, 3): "estais mortos para as coisas terrenas e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus".
De Humanitate Christi, cap. XLII
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 29  -  Não se esqueça de que Jesus quer se servir de você na sua situação atual.

terça-feira, 28 de março de 2023

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 28  -  Que você imite Jesus crucificado, que viva para Ele, a fim de ressuscitar com Ele para glória eterna.

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - Sto. Afonso Maria de Ligorio

CAPÍTULO XV

Palavras de Jesus na cruz

Jesus, porém, que faz, que diz, vendo-se o objeto de tantos ultrajes? Suplica por aqueles que assim o maltratam: “Pai, perdoai-lhes, pois não sabem o que fazem” (Lc 23,34). Jesus orou então também por nós, pecadores. Por isso, voltados para o Padre eterno, digamos com confiança: Ó Pai, ouvi a voz deste Filho querido que vos suplica que vos perdoeis. Um tal perdão é sem dúvida grande misericórdia com relação a nós, que não o merecíamos, mas com relação a Jesus Cristo, que nos satisfez superabundantemente por nossos pecados, é justiça. Vós estais obrigado por seus merecimentos a perdoar e a receber na vossa graça quem se arrepende das ofensas que vos fez. Eu me arrependo, ó meu Pai, de todo o meu coração, de vos haver ofendido e em nome desse vosso Filho os peço o perdão. Perdoai-me e recebei-me na vossa graça.

“Senhor, lembrai-vos de mim quando entrardes no vosso reino” (Lc 23,42). Assim foi que se dirigiu o bom ladrão a Jesus agonizante, que lhe respondeu: “Em verdade eu te afirmo, que hoje estarás comigo no paraíso” (Lc 23,43). Assim se cumpriu o que Deus já havia dito por Ezequiel, que, quando um pecador se arrepende de suas culpas, Deus lhe perdoa e se esquece das ofensas que lhe foram feitas: “Se, porém, o ímpio fizer penitência... não me recordarei mais de todas as suas iniqüidades” (Ez 18,21). Ó caridade imensa, ó bondade infinita de meu Deus, quem deixará de vos amar? Sim, meu Jesus, esquecei-vos das injúrias que vos fiz e lembrai-vos da morte tão cruel que por mim sofrestes e por ela dai-me o vosso reino na outra vida e na presente fazei reinar em mim o vosso santo amor. Unicamente o vosso amor domine no meu coração e seja ele o meu único Senhor, meu único desejo, meu único amor. Feliz ladrão, que mereceste ser o companheiro paciente da morte de Jesus! Feliz de mim, ó meu Jesus, se tiver a sorte de morrer amando-vos e unindo a minha morte à vossa santa morte. “Estava, porém, ao pé da cruz de Jesus, sua Mãe” (Jo 19,25).

Considera, minha alma, ao pé da cruz, Maria, sua Mãe, traspassada de dores e com os olhos fixos no amado e inocente Filho, contemplando as crudelíssimas dores externas e internas no meio das quais ele morre. Ela está toda resignada e em paz, oferecendo ao eterno Pai a morte do Filho por nossa salvação. Mas muito a afligem a compaixão e o amor. Ó Deus, quem não se compadeceria de uma mãe que se encontrasse junto ao patíbulo do filho que lhe está morrendo diante dos olhos? E, então, se considerarmos quem seja essa Mãe e quem esse Filho! Maria amava esse Filho imensamente mais do que todas as mães amam a seus filhos. Ela amava Jesus por ser ao mesmo tempo seu Filho e seu Deus: Filho sumamente amável, incomparavelmente belo e santo, Filho que lhe fora sempre respeitoso e obediente, Filho que tanto a amara e que desde a eternidade a escolhera por mãe. E essa mãe foi quem teve de ver morrer de dores um tal filho, diante de seus olhos, naquele lenho infame, sem poder procurar-lhe o menor alívio e até aumentando com sua presença o seu tormento, pois a via padecer assim por seu amor. Ó Maria, pelas dores que sofrestes na morte de Jesus, tende piedade de mim e recomendai-me a vosso Filho. Ouvi como ele, na pessoa de S. João, me recomenda a vós: “Mulher, eis aí teu Filho” (Jo 19,26).

“E perto da hora nona, clamou Jesus em alta voz, dizendo: Meu Deus, meu Deus, por que me desamparastes?” (Mt 27,46). Jesus agonizando na cruz, com o corpo estarrecido de dor e o espírito inundado de aflição (pois que aquela tristeza que o assaltou no horto o acompanhou até ao último suspiro de sua vida) procura alguém que o console, mas não encontra ninguém, como já o predissera Davi: “Esperei alguém que me consolasse e não o encontrei” (Sl 68,21). Olha para sua Mãe e esta não o consola, antes mais o aflige com sua presença. Olha em redor e vê que todos se mostram como seus inimigos. Vendo-se assim privado de todo o conforto, volta-se para seu eterno Pai a pedir-lhe alívio. Vendo-o, porém, o Pai coberto com todos os pecados dos homens, por quem ele estava na cruz a satisfazer sua justiça divina, também o abandona a uma morte de pura dor. E foi então que Jesus gritou, para exprimir a veemência de sua pena, dizendo: Meu Deus, por que até vós me abandonais? A morte de Jesus foi, pois, a morte mais atroz que a de todos os mártires, pois que foi uma morte inteiramente desolada e privada de todo o alívio. Mas, ó meu Jesus, se vos oferecestes espontaneamente a uma morte tão dura, por que então vos lamentais? Ah, eu vos compreendo, vós vos lamentais para nos fazer compreender a pena excessiva com que morreis e nos dar ao mesmo tempo ânimo para confiar e nos resignarmos no tempo em que nos virmos desolados e privados da assistência sensível da graça divina.

Meu doce Redentor, esse vosso abandono me faz esperar que Deus não me abandonará, apesar de tê-lo traído tantas vezes. Ó meu Jesus, como pude viver tanto tempo esquecido de vós? Agradeço-vos por vos não terdes esquecido de mim. Suplico-vos que me façais recordar sempre da morte cruel que sofrestes por meu amor, para que eu não me esqueça mais de vós e do amor que me consagraste. Sabendo, entretanto, o Salvador que seu sacrifício já estava consumado, disse que tinha sede e os soldados puseram-lhe nos lábios uma esponja embebida em vinagre: “Em seguida, sabendo Jesus que tudo estava consumado, para se cumprir ainda a Escritura, disse: Tenho sede... Eles lhe chegaram à boca uma esponja ensopada em vinagre” (Jo 19,28). A Escritura que devia cumprir-se era a profecia de Davi: “E na minha sede me propinaram vinagre” (Sl 68,22). Mas, Senhor, vós vos queixais de tantas dores que vos arrebatam a vida, e vos lamentais da sede? Ah, a sede de Jesus era diferente da que passamos. A sede que ele tem é o desejo de ser amado pelas almas pelas quais morre. Logo, ó Jesus meu, vós tendes sede de mim, ver-me miserável, e eu não terei sede de vós, bem infinito? Ah, sim, eu vos quero, eu vos amo e desejo agradar-vos em tudo. Ajudai-me, Senhor, a expelir de meu coração todos os desejos terrenos e fazei que em mim reine o único desejo de agradar-vos e fazer a vossa vontade. Ó santa vontade de Deus, vós que sois a bela fonte que saciais as almas imortais, saciai-me também a sede o fito de todos os meus pensamentos e de todos os meus afetos.

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

35. Terça-feira depois do I domingo da Paixão: O Sepulcro de Cristo

terça-feira da I semana da Paixão

«Porque molestais esta mulher? Ela fez-me verdadeiramente uma boa obra... derramando ela este bálsamo sobre o meu corpo, fê-lo como para me sepultar» (Mt 26, 10-12)
Era conveniente que Cristo fosse sepultado.
1. Primeiro, para comprovar a verdade da sua morte; pois, ninguém é posto num sepulcro senão quando consta que está verdadeiramente morto. Por isso no Evangelho (Mc 15, 44-45), se lê que Pilatos, antes de permitir que Cristo fosse sepultado, procurou saber por uma inquisição diligente, se estava morto.

2. Segundo, porque tendo ressurgido do sepulcro, deu a esperança de ressurgir, por meio dele, aos que estão sepultos, segundo aquilo do Evangelho (Jo 5, 28): "Todos os que se acham nos sepulcros ouvirão a voz do Filho de Deus".

3. Terceiro, para exemplo dos que, pela morte de Cristo, morreram espiritualmente aos pecados, conforme aquilo da Escritura (Sl 30, 21): "Estão escondidos contra a turbação dos homens". Por isso diz o Apóstolo (Cl 3, 3): "Já estais mortos e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus". E assim também os batizados, que pela morte de Cristo morreram aos pecados, são como consepultos com Cristo, pela imersão, segundo o Apóstolo (Rm 6, 4): "Nós fomos sepultados com Cristo para morrer pelo batismo".
*
Assim como a morte de Cristo obrou eficientemente a nossa salvação, também a sua sepultura. Por isso diz Jerônimo: Ressurgimos pela sepultura de Cristo. E aquilo da Escritura (Is 53, 9): "E dará os ímpios pela sepultura", diz a Glosa: i. é, as gentes, que não tinham a piedade, da-los-á a Deus Padre, porque os ganhou pela sua morte.
*
De Cristo diz a Escritura (Sl 87, 6): "Chegou a ser homem como sem socorro, livre entre os mortos". Ora, Nosso Senhor mostrou que mesmo sepulto entre os mortos era livre, pelo fato da inclusão do sepulcro não ter podido impedi-lo de sair dele pela ressurreição.
IIIa q. LI a. 1
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

segunda-feira, 27 de março de 2023

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

34. Segunda-feira depois do I domingo da Paixão: A Paixão de Cristo é remédio contra todos os pecados

segunda-feira da I semana da Paixão

A todos os males que contraímos pelo pecado, encontramos remédio na Paixão de Cristo. Contraímos pelo pecado cinco males:
O primeiro, é a própria mancha do pecado. Quando um homem peca, conspurca a sua alma, porque, como a virtude embeleza, o pecado a enfeia. Lê-se em Barruch: "Por que estás, ó Israel, na terra dos inimigos, e te contaminaste com os mortos?" (Br 3, 10). Mas a Paixão de Cristo lavou esta mancha. Cristo, na sua Paixão, fez do seu sangue um banho para nele lavar os pecadores: "Lava-os do pecado no
sangue" (Ap 1, 5). No Batismo a alma é lavada no Sangue de Cristo, por que este recebe do Sangue de Cristo a força regeneradora. Por isso, quando alguém batizado se macula pelo pecado, faz uma injúria a Cristo e o seu pecado é maior que o cometido antes do batismo. Lê-se na Carta aos Hebreus: "O que desprezou a lei de Moisés, após ouvido o testemunho de dois ou três, deve morrer" (Heb 10, 28-29). Como não deve merecer maiores suplícios, aquele que pisou no Sangue do Filho de Deus e considerou impuro o Sangue da Aliança?
O segundo mal que contraímos pelo pecado é nos tornarmos objeto da aversão de Deus. Assim como quem é carnal ama a beleza da carne, do mesmo modo Deus ama a beleza espiritual, que é a beleza da alma. Quando, por conseguinte, a alma se deixa contaminar pelo mal do pecado, Deus fica ofendido e odeia o pecador. Lê-se no Livro da Sabedoria: "Deus odeia o ímpio e a sua impiedade" (Sb 14, 9). Mas a Paixão de Cristo remove essas coisas, por que ela satisfez ao Pai ofendido pelo pecado, cuja satisfação
não poderia vir do homem. A caridade e a obediência de Cristo foram maiores que o pecado e a desobediência do primeiro homem.
O terceiro mal é a fraqueza. O homem, pecando pela primeira vez, pensa que depois pode abster-se do pecado. Acontece, porém, o contrário: debilita-se pelo primeiro pecado e fica inclinado a pecar mais. O pecado vai dominando cada vez mais o homem, e este, por si mesmo, coloca-se em tal estado que não pode mais se levantar. É como alguém que se lançou num poço. Só pode sair dele pela força divina. Depois que o homem pecou, a nossa natureza ficou debilitada, corrompida, e, por isso mesmo, ficou ele
mais inclinado para o pecado. Mas Cristo diminuiu essa fraqueza e debilidade, bem que não as tenha totalmente apagado. O homem foi fortalecido pela Paixão de Cristo e o pecado, enfraquecido, de sorte que este não mais o dominará. Pode, por esse motivo, auxiliado pela graça divina, que é conferida pelos sacramentos cuja eficácia recebem da Paixão de Cristo, esforçar-se para sair do pecado. Lê-se em S. Paulo: "O nosso velho homem foi crucificado juntamente com Ele, para que fosse destruído o corpo do pecado" (Rm 6, 6).Antes da Paixão de Cristo, poucos havia sem pecado mortal. Mas, depois dela, muitos viveram e vivem sem pecado mortal.
O quarto mal é a obrigação que temos de cumprir a pena do pecado. A justiça de Deus exige que o pecado seja punido, e a pena é medida pela culpa. Como a culpa do pecado é infinita, porque ela vai contra o bem infinito, Deus, cujo mandamento o pecador desprezou, também a pena devida ao pecado mortal é infinita. Mas Cristo pela sua Paixão livrou-nos dessa pena, assumindo-a Ele próprio. Confirma-o S. Pedro: "Os nossos pecados (i. é., a pena do pecado) Ele carregou no seu corpo" (1 Pd 2, 24). Foi de tal modo exuberante a virtude da Paixão de Cristo, que ela só foi suficiente para expirar todos os pecados de todos os homens, mesmo que fossem em número de milhões. Eis o motivo pelo qual aquele que foi batizado, foi também purificado de todos os pecados. É também por este motivo que os sacerdotes perdoam os pecados. Do mesmo modo, aquele cujo sofrimento mais se assemelha ao da Paixão de Cristo, consegue um maior perdão e merece maiores graças.
O quinto mal contraído pelo pecado foi nos termos tornados exilados do reino do céu. É natural que aqueles que ofendem o rei sejam obrigados a sair da pátria. O homem foi afastado do paraíso por causa do pecado: Adão imediatamente após o pecado foi expulso do paraíso, e sua porta lhe foi trancada. Mas Cristo, pela sua Paixão, abriu aquela porta e novamente chamou os exilados para o reino. Quando foi aberto o lado de Cristo, foi também a porta do paraíso aberta; quando o seu Sangue foi derramado, a mancha foi apagada, Deus foi aplacado, a fraqueza foi afastada, a pena foi expiada, e os exilados foram convocados para o reino. Por isso é que foi logo dito ao ladrão: "Estarás hoje comigo no Paraíso" (Lc. 23, 43). Observe-se que nesse momento não foi dito — outrora; que também não foi dito a outrem — nem a Adão, nem a Abraão, nem a David; foi dito, hoje, isto é, logo que a porta foi aberta, e o ladrão pediu e recebeu perdão. Lê-se na carta aos Hebreus: "Confiantes na entrada no santuário pelo Sangue de Cristo" (Heb. 10, 19). Fica assim esclarecido como a Paixão de Cristo foi útil, enquanto remédio contra o pecado.
In Symb.
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - Sto. Afonso Maria de Ligorio

CAPÍTULO XIV

Jesus é crucificado

Apenas chegou Jesus ao Calvário, consumido de dores e desfalecido, dão-lhe a beber vinho misturado com fel, o que se costumava dar aos condenados à cruz para mitigar-lhes um pouco o sentimento de dor. Jesus, que queria morrer sem alívio, apenas o provou, mas não bebeu: “E deram-lhe a beber vinho misturado com fel e, tendo ele experimentado, não quis bebê-lo” (Mt 27,34). Forma-se um círculo em torno de Jesus, os soldados tiram-lhe as vestes, que, estando pegadas a seu corpo todo chagado e retalhado, ao serem arrancadas levam consigo muitos pedaços de carne, atirando-o em seguida sobre a cruz. Jesus estende suas sagradas mãos e oferece ao eterno Pai o grande sacrifício de si mesmo e suplica-lhe que o aceite por nossa salvação.

Eis que já tomam com fúria os pregos e os martelos e, transpassando as mãos e os pés de nosso Salvador, pregam-no na cruz. O som das marteladas ressoa por todo aquele monte e se faz ouvir também por Maria, que, acompanhando o Filho, já havia também chegado. Ó mãos sagradas, que com vosso contacto sarastes tantos enfermos, por que vos atravessam nessa cruz? Ó pés sacrossantos, que tanto vos cansastes, correndo atrás de nós, ovelhas desgarradas, por que vos encravam com tantas dores? No corpo humano, apenas se atinge um nervo, é tão aguda a dor, que isso ocasiona desmaios e espasmos mortais. Qual, pois, terá sido o tormento de Jesus, ao lhe serem traspassadas com cravos as mãos e os pés, lugares cheios de ossos e nervos? Ó meu doce Salvador, quanto vos custou a minha salvação e o desejo de conquistar o amor de um verme miserável! E eu, ingrato, tantas vezes vos neguei o meu amor e voltei-vos as costas!

A um dado momento, levantam a cruz com o crucificado e fazem-na cair com violência no buraco cavado na rocha. É firmada com pedras e madeira e Jesus nela pregado fica suspenso entre dois ladrões, para aí findar a vida. “E o crucificaram e com ele dois outros, um de cada lado, e no meio Jesus” (Jo 19,18). Isaías já o havia predito: “Ele foi posto no número dos malfeitores” (Is 53,12). Na cruz estava afixada uma inscrição que dizia: “Jesus Nazareno, rei dos judeus”. Queriam os sacerdotes que se mudasse tal inscrição; Pilatos, porém, não quis mudá-la, porque Deus queria que todos soubessem que os hebreus deram a morte a seu verdadeiro rei e Messias por tanto tempo esperado e desejado por eles mesmos.

Jesus na cruz: eis a prova do amor de um Deus. Eis a última aparição que o Verbo encarnado faz nesta terra. A primeira foi num estábulo e esta última é numa cruz: tanto uma como a outra demonstram o amor e a caridade imensa que ele tem pelos homens. São Francisco de Paula, meditando um dia no amor de Jesus Cristo em sua morte, extasiado e levado acima da terra, exclamou três vezes em alta voz: Ó Deus caridade! Ó Deus caridade! Ó Deus caridade! Com isso o Senhor queria ensinar-nos por meio do santo que nós nunca seremos capazes de compreender o amor infinito que nos demonstrou esse Deus, querendo sofrer tanto e morrer por nós. Minha alma, chega-te humilhada e enternecida àquela cruz, beija ao mesmo tempo este altar em que morre o teu amável Senhor. Coloca-te debaixo de seus pés e faze que escorra sobre ti seu sangue divino e suplica o eterno Pai, mas em sentido diferente do que fizeram os judeus: Seu sangue caia sobre nós (Mt 27,25). Senhor, que esse sangue escorra sobre nós e nos lave de nossos pecados: este sangue não vos pede vingança, como pedia o sangue de Abel, mas vos pede perdão e misericórdia para nós. É o que o vosso Apóstolo me anima a esperar, quando diz: Vós, porém, vos aproximastes do Mediador do Novo Testamento, Jesus, e da aspersão do sangue que fala melhor que o de Abel (Hb 12,24).

Ó Deus, quando padece na cruz nosso Salvador moribundo! Cada membro está sofrendo e um não pode socorrer o outro, estando os pés e as mãos presos pelos cravos. A cada instante ele sofre dores mortais e assim pode-se dizer que naquelas três horas de agonia sofreu Jesus tantas mortes quantos os momentos que esteve pendente da cruz. Sobre esse leito não teve o Senhor um só momento de alívio ou repouso. Ora se apoiava sobre os pés, ora sobre as mãos, mas onde se apoiava crescia a dor. Aquele corpo sagrado estava suspenso sobre suas próprias chagas, pois as mãos e os pés cravados deviam sustentar o peso de todo o corpo.

Ó meu caro Redentor, se eu vos contemplo exteriormente, não vejo senão chagas e sangue; se observo vosso interior, vejo vosso coração todo aflito e desconsolado. Leio sobre essa cruz que vós sois rei, mas que insígnias tendes de realeza? eu não vejo outro trono a não ser esse lenho de opróbrio; não vejo outra púrpura a não ser vossa carne ensangüentada e dilacerada; não vejo outra coroa além desse feixe de espinhos que tanto vos atormenta. Ah, sim, tudo vos proclama rei, não de honra, mas de amor: essa cruz, esse sangue, esses cravos e essa coroa são incontestavelmente insígnias de amor. Assim Jesus na sua cruz não procura tanto a nossa compaixão, como o nosso afeto. E se pede compaixão, pede-a unicamente para que ela nos induza a amá-lo. Ele merece já por sua bondade todo o nosso amor, mas agora procura ser amado ao menos por compaixão. Ah, meu Jesus, tivestes muita razão de afirmar, antes da vossa paixão, que uma vez levantado na cruz, havíeis de atrair para vós todos os corações. “Quando eu for exaltado atrairei tudo para mim” (Jo 12,32). Oh! quantas setas de fogo enviais aos nossos corações desse trono de amor! Oh! quantas almas felizes atraístes a vós dessa cruz, livrando-as das fauces do inferno. Permiti-me, pois, dizer-vos: Com razão, Senhor, vos colocaram no meio de dois ladrões, pois vós com vosso amor haveis roubado a Lúcifer tantas almas que por justiça lhe per- tenciam por causa de seus pecados. E eu espero ser uma destas. Ó chagas de meu Jesus, ó belas fornalhas de amor, recebei-me no meio de vós, para me abrasar, não já no fogo do inferno por mim merecido, mas nas santas chagas de amor daquele Deus que por mim quis morrer consumido de tormentos.

Os carrascos, depois de haverem crucificado a Jesus, dividem entre si as suas vestes, segundo a profecia de Davi: “Repartiram entre si os meus vestidos e lançaram sorte sobre a minha túnica” (Sl 21,19) e, assentando-se todos, esperam por sua morte. Minha alma, assenta-te aos pés daquela cruz e debaixo de sua sombra de salvação repousa durante tua vida inteira, a fim de que possas dizer com a esposa sagrada: “Assentei-me à sombra daquele que eu tanto havia desejado” (Ct 2,3). Oh! que repouso encantador é o que encontram as almas amantes de Deus junto a Jesus crucificado, no meio dos tumultos do mundo, das tentações do inferno e dos temores dos juízos divinos!

Estando Jesus em agonia, com os membros doloridos e com o coração desolado e triste, procurava quem o consolasse. Mas, ó meu Redentor, não se encontra alguém que vos console? Se ao menos houvesse alguém que se compadecesse de vós e com lágrimas acompanhasse vossa agonia tão atroz! Mas, ó tristeza, vejo que uns vos injuriam, outros vos encarnecem, outros ainda blasfemam contra vós. Estes dizem: “Se és o Filho de Deus, desce da cruz” (Mt 27,40). Aqueles: “Ó tu, que destróis o templo de Deus... salva-te a ti mesmo” (Mc 15,29-30). E outros: “Salvou a outros e não pode salvar-se a si mesmo” (Mt 27,42). Senhor, que condenado se viu jamais tão coberto de injúrias e opróbrios no momento de sua morte no patíbulo infame?

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 27  -  Nos momentos de desolação, levante sua voz ao Céu.

domingo, 26 de março de 2023

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

33. Primeiro domingo da Paixão: A Paixão de Cristo

Primeiro domingo da Paixão

«E como Moisés levantou no deserto a serpente, assim também importa que seja levantado o Filho do homem, a fim de que todo o que crê nele tenha a vida eterna.» (Jo 3, 14-15)
Aqui há três coisas que devemos considerar:
1. A figura da Paixão: "E como Moisés levantou no deserto a serpente". Ao povo judeu, que dizia: "a nossa alma está enfastiada deste alimento levíssimo" (Nm 21, 5), Deus, para lhes castigar, enviou serpentes. Em seguida, ordenou que fizessem uma serpente de bronze como remédio contra as serpentes e em figura da Paixão. É próprio da serpente possuir veneno, mas a serpente de bronze não era venenosa. Do mesmo modo, Cristo não tinha pecado, que é um veneno, mas assemelhou-se ao pecador, conforme esta palavra de são Paulo: "enviou Deus seu Filho em carne semelhante à do pecado" (Rm 8, 3). Por isso, Cristo produziu o efeito da serpente de bronze contra o ímpeto das concupiscências abrasadas.

2. O modo da Paixão: "importa que seja levantado o Filho do homem", o que se compreende do levantamento da cruz. Cristo quis morrer levantado:
a) Para purificar o céu. Pela santidade da sua vida, purificara já a terra, restava purificar o ar.
b) Para triunfar sobre o demônio, que prepara a guerra nos ares.
c) Para atrair nossos corações a si: "Eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a mim" (Jo 12, 32). Ao morrer na Cruz, foi exaltado, pois triunfou de seus inimigos, a ponto de sua morte ser chamada exaltação. Diz o Salmo: "Beberá da torrente no caminho, por isso levantará a sua cabeça" (Sl 109). E foi a cruz a causa de sua exaltação, como diz são Paulo: "Humilhou-se a si mesmo, feito obediente até à morte, e morte de cruz. Por isso também Deus o exaltou" (Fl 2, 8)

3. O fruto da Paixão. O fruto é a vida eterna. Por isso diz: a fim de que todo o que crê nele, e faça boas boas, não pereça, mas tenha a vida eterna". Este fruto corresponde ao fruto figurado da serpente de bronze. Com efeito, quem se voltasse para ela, curava-se do veneno e salvava sua vida. Volta-se para o Filho do Homem exaltado na cruz quem crê em Cristo crucificado e, assim, curando-se do veneno e do pecado, conserva-se para a vida eterna.
In Joan, III
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - Sto. Afonso Maria de Ligorio

CAPÍTULO XIII

Jesus leva a cruz ao Calvário

Publicada a sentença, o povo infeliz explode num grito de júbilo e diz: Alegremo-nos, alegremo-nos. Jesus já foi condenado; não se perca tempo, apreste-se a cruz e que morra hoje mesmo, pois que amanhã é páscoa. E imediatamente o tomam, tiram-lhe aquele farrapo de púrpura, restituem-lhe suas vestes, para que fosse reconhecido pelo povo, segundo S. Ambrósio, por aquele impostor (como o chamavam) que dias antes tinha sido acolhido como o Messias: “Tiraram-lhe a clâmide e o revestiram com suas vestes e o conduziram para ser crucificado”. (Mt 27,31). Em seguida tomam duas traves grosseiras, e formam com ela às pressas uma cruz e, com insolência, mandam-lhe que a ponha sobre os ombros e a carregue até ao lugar do suplício. Ó Deus, que barbaridade, sobrecarregar com um tal peso um homem tão atormentado e desprovido de forças!

Jesus abraça a cruz com amor: “E, levando sua cruz às costas, saiu para aquele lugar que se chama Calvário” (Jo 19,17). A justiça sai com os condenados e entre esses vai também nosso Salvador, carregando o altar em que deve sacrificar a sua vida. Muito bem considera um piedoso autor que na paixão de Jesus Cristo foi tudo maravilhoso e excessivo como Moisés e Elias o afirmaram no Tabor: “E falavam de seu excesso, que iria realizar em Jerusalém” (Lc 9,31). Quem poderia jamais crer que a vista de Jesus, reduzido a uma só chaga da cabeça aos pés, irritasse ainda mais o furor dos judeus e o desejo de vê-lo crucificado? Que tirano obrigou jamais o próprio réu a levar sobre seus ombros o instrumento de seu tormento, vendo-o exausto e consumido já de dores? É horror considerar a multidão de tormentos e ludíbrios que fizeram Jesus sofrer no pequeno espaço de sua prisão até sua morte, sucedendo uns aos outros, sem intervalo, prisão, bofetadas, escarros, zombarias, flagelos, espinhos, cravos, agonia e morte. Todos se uniram, hebreus e gentios, sacerdotes e populares, para tornarem Jesus Cristo o homem dos desprezos e das dores, como havia predito o profeta Isaías. O juiz declara o Salvador inocente, mas uma tal declaração só serve para acarretar-lhe maiores sofrimentos e vitupérios, pois se logo no princípio tivesse Pilatos condenado Jesus à morte, não lhe teriam preferido Barrabás, nem teria sido tratado como louco, nem flagelado tão cruelmente, nem coroado de espinhos.

Mas voltemos a considerar o espetáculo admirável do Filho de Deus, que vai morrer por aqueles mesmos homens que o conduzem à morte. Eis realizada a profecia de Jeremias: “E eu sou semelhante ao manso cordeiro, que é levado para ser vitimado” (Jr 11,19). Ó cidade ingrata, assim expeles de ti com tão grande desprezo o teu Redentor, depois de receberes dele tantas graças? Ó Deus, é isso o que faz também uma alma que, depois de favorecida por Deus com tantos favores, ingrata, o expulsa pelo pecado.

A vista de Jesus nessa caminhada para o Calvário causava tal compaixão, que as mulheres ao vê-lo se punham a chorar e lamentar de tanta crueldade: “Seguia-o uma grande multidão de povo e de mulheres, que choravam e o lamentavam” (Lc 23,27). O Redentor, porém, voltando-se para elas, diz-lhes: “Não choreis sobre mim, mas sobre vossos filhos. Porque se assim fazem com o lenho verde, que farão com o seco?” (Lc 23,27). O Redentor, porém, voltando-se para elas, diz-lhes: “Não choreis sobre mim, mas sobre vossos filhos. Porque se assim fazem com o lenho verde, que farão com o seco?” (Lc 23,31). Com isso queria dar a entender o grande castigo que merecem os nossos pecados, pois se ele, inocente e Filho de Deus, era assim tratado por se ter oferecido a satisfazer por nós, como deveriam ser tratados os homens por seus próprios pecados?

Contempla-o também tu, minha alma, vê como está todo dilacerado, coroado de espinhos, onerado com aquele pesado lenho e acompanhado por gente que lhe é contrária e que o segue injuriando-o e maldizendo-o. Ó Deus, seu corpo sagrado está todo retalhado, de tal maneira que a qualquer movimento que faz se renova a dor de todas as suas chagas. A cruz já agora o atormenta, pois ela comprime seus ombros chagados e vai encravando cada vez mais os espinhos daquela bárbara coroa! Que dores a cada passo! Jesus, porém, não a abandona. Sim, não a deixa porque por meio da cruz ele quer reinar nos corações dos homens. como predisse Isaías: “E foi posto o principado sobre o seu ombro” (Is 9,6). Ah, meu Jesus, com que sentimentos de amor para comigo vós caminháveis para o Calvário, onde devíeis consumar o grande sacrifício da vossa vida!

Minha alma, abraça também a tua cruz por amor de Jesus, que por teu amor padece tanto. Nota como ele vai adiante com sua cruz e te convida a segui-lo com a tua: “Quem quiser vir após mim, tome sua cruz e siga-me” (Mt 16,24). Sim, meu Jesus, não quero deixar-vos, quero seguir-vos até à morte. Vós, porém, pelos merecimentos de vossa subida tão dolorosa ao Calvário, dai-me a força de levar com paciência as cruzes que me enviardes. Oh! vós tornastes muito amáveis as dores e desprezos, abraçando-os com tanto amor por nós.

“Encontraram um homem de Cirene, chamado Simão; obrigaram-no a carregar a cruz de Jesus”. (Mt 27,32). “E puseram-lhe a cruz par que a carregasse atrás de Jesus” (Lc 23,26). Foi isso talvez motivado pela compaixão, desvencilhar Jesus da cruz e fazê-la carregar pelo Cirineu? Não, foi só iniqüidade e ódio. Vendo os judeus que o Senhor quase exalava sua alma a cada passo que dava, temeram que antes de chegar ao Calvário expirasse no caminho, e porque eles o queriam ver morto, mas morto crucificado, para que sua memória ficasse para sempre denegrida, obrigaram o Cirineu a carregar-lhe a cruz. Era essa sua intenção, pois, para eles, morrer crucificado era o mesmo que morrer amaldiçoado por todos: “Amaldiçoado é o que pende da cruz” (Dt 21,23), dizia sua lei. Por isso, quando buscavam a morte de Jesus, não só pediam a Pilatos que o fizesse morrer, mas sempre instavam, gritando: Crucifica-o, seja crucificado! para que seu nome ficasse desprestigiado na terra e nem sequer fosse mais lembrado, conforme a profecia de Jeremias; “Exterminemo-lo da terra dos viventes e não haja mais memória de seu nome” (Jr 11,19). E foi essa a razão por que lhe tiravam a cruz dos ombros, para que chegasse vivo ao Calvário e assim tivessem o gosto de vê-lo morrer crucificado. Ah, meu Jesus desprezado, vós sois a minha esperança e todo o meu amor.

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 26  -  Nunca se deite antes de ter examinado a sua consciência, revendo todo o seu dia.

sábado, 25 de março de 2023

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

32. Sábado depois do IV domingo da Quaresma: O modo mais conveniente para a liberação do gênero humano

Sábado depois do IV domingo da Quaresma

Tanto um meio é mais conveniente para conseguir um fim, quanto mais ele faz concorrerem elementos conducentes ao fim. Ora, o ser o homem liberado pela paixão de Cristo foi causa de concorrerem muitos elementos conducentes à salvação do mesmo, além da liberação do pecado.

1. Assim, primeiro, desse modo o homem conhece quanto Deus o ama; o que o excita a amá-lo mais, e nisso consiste a perfeição da salvação humana. Donde o dizer o Apóstolo: "Deus faz brilhar a sua caridade em nós, porque ainda quando éramos pecadores, morreu Cristo por nós" (Rm 5, 8).

2. Segundo, porque por esse meio nos deu o exemplo da obediência, da humildade, da constância, da justiça e das demais virtudes, reveladas na paixão de Cristo e que são necessárias à salvação humana. Por isso diz a Escritura (1 Pd 2, 21): "Cristo padeceu por nós, deixando-vos exemplo para que sigais as suas pisadas".

3. Terceiro, porque Cristo, com sua paixão, não somente liberou o homem do pecado, mas ainda lhe mereceu a graça justificante e a glória da beatitude.

4. Quarto, porque, assim, uma necessidade maior impôs ao homem conservar-se imune do pecado, segundo aquilo do Apóstolo (1 Cor 6, 20): "Porque vós fostes comprado por um grande preço; glorificai, pois, e trazei a Deus no vosso corpo".

5. Quinto, porque contribuiu para maior dignidade do homem, de modo que assim como fora vencido e enganado pelo diabo, assim também fosse ele mesmo quem vencesse o diabo; e assim como o homem mereceu a morte, assim também, morrendo, a vencesse a ela, conforme o dizer do Apóstolo (1 Cor 15, 57): "Graças a Deus, que nos deu a vitória, por Jesus Cristo". Por isso foi mais conveniente que, pela paixão de Cristo fossemos liberados, do que pela só vontade de Deus.
IIIa q. XLVI, a. 3
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - Sto. Afonso Maria de Ligorio

CAPÍTULO XII

Jesus é condenado por Pilatos

“Então ele lho entregou para que fosse crucificado” (Jo 19,16). Pilatos, depois de tantas vezes ter declarado a inocência de Jesus, e então novamente lavando suas mãos e protestando que era inocente do sangue daquele justo, sendo os judeus responsáveis por sua morte: “Mandado vir água, lavou as mãos à vista do povo, dizendo: Eu sou inocente do sangue deste justo: vós lá vos avenhais” (Mt 27,24), assim mesmo dá a sentença e o condena à morte. Ó injustiça jamais vista no mundo! O juiz condena o acusado ao mesmo tempo que o declara inocente. S. Lucas escreve que Pilatos entregou Jesus nas mãos dos judeus para que fizessem com ele o que desejavam: “Entregou Jesus à sua vontade” (Lc 23,25). De fato, é o que acontece quando se condena um inocente: ele é abandonado nas mãos de seus inimigos, para que o façam morrer, e morrer da maneira que for do gosto deles. Infelizes judeus, vós dissestes: “Seu sangue caia sobre nós e nossos Filhos” (Mt 27,25), e assim chamastes sobre vós o castigo e este já vos alcançou: vossa nação já sofre e sofrerá o castigo desse sangue inocente até ao fim do mundo.

A injusta sentença de morte é lida diante do condenado. O Senhor a ouve e inteiramente resignado ao justo decreto de seu eterno Pai; que o condena à morte da cruz, não pelos delitos que lhe imputavam falsamente os judeus, mas por nossas culpas verdadeiras, pelas quais se oferecera a satisfazer com sua morte. Pilatos diz na terra: Morra Jesus, e o Padre eterno o confirma no céu, dizendo: Morra meu Filho. E o Filho diz também: Eis-me aqui; eu obedeço, aceito a morte e a morte da cruz. “Ele se humilhou, fazendo-se obediente até à morte e a morte de cruz” (Fl 2,8). Meu amado Redentor, aceitastes a morte que me era devida e com vossa morte me obtivestes a vida. Eu vos agradeço, meu amor, e espero poder louvar no céu as vossas misericórdias para sempre: “Cantarei eternamente as misericórdias do Senhor”. Visto que vós, inocente, aceitastes a morte da cruz, eu, pecador, aceito-a com todas as penas que a devem acompanhar e desde já a ofereço a vosso eterno Pai, unindo-a à vossa santa morte. Pelos merecimentos de vossa morte tão dolorosa, concedei-me, ó meu Jesus, a sorte de morrer em vossa graça e ardendo em vosso santo amor.

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 25  -  O caminho do Calvário é longo; o expirar na cruz é dolorosíssimo; mas o aleluia que a alma cantará será eterno!

sexta-feira, 24 de março de 2023

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 24  -  O sofrimento suportado de maneira cristã é a condição que Deus, autor de todas as graças e de todos os dons que conduzem à salvação, estabeleceu para conceder-nos a glória eterna.

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

31. Sexta-feira depois do IV domingo da Quaresma: O Preciosíssimo Sangue de Nosso Senhor

Sexta-feira da IV semana da Quaresma

I. — Pelo sangue de Cristo, foi selado o Novo Testamento. "Este cálice é o novo testamento no meu sangue" (1 Cor 11, 25).
Testamento compreende-se de dois modos:
- A palavra "testamento" é comumente utilizada para significar algum pacto. Assim, Deus fez por duas vezes pactos com o gênero humano. Na primeira vez, prometendo bens temporais e livrando-nos dos males temporais; e este pacto é chamado Antigo Testamento. Na segunda vez, prometendo bens espirituais e livrando-nos dos males contrários; e este pacto é chamado Novo Testamento. Tudo isso conforme as Escrituras: "Estão a chegar os dias, diz o Senhor, em que farei nova aliança com a casa de Israel e com a casa de Judá, diferente da aliança que fiz com seus pais do Egito (...) Eis a aliança que farei com a casa de Israel depois daqueles dias, diz o Senhor: Imprimirei a minha lei no seu íntimo, escrevê-la-ei nos seus corações; serei o seu Deus e eles serão o meu povo" (Jr 31, 33). Os antigos costumavam fundir o sangue de uma vítima para selar um pacto, Moisés tomou sangue e o aspergiu sobre o povo, dizendo: Este é o sangue da aliança que o Senhor firmou convosco. Assim, portanto, o antigo testamento ou pacto foi selado no sangue de touros; o Novo Testamento ou pacto, no sangue de Cristo, vertido em sua Paixão.
- A palavra "testamento" também é utilizada, de modo mais estrito, para significar a disposição de uma herança. Ora, o testamento, nesta acepção, não é recebido senão pela morte; pois, como diz são Paulo: "o testamento só produz seu efeito em caso de morte, não tendo força enquanto vive o testador" (Heb 9, 17). Deus inicialmente dispusera para uma herança eterna, mas, sob a figura dos bens temporais; o que constitui o Antigo Testamento. Mas, em seguida, fez um Novo Testamento, pelo qual prometeu expressamente a herança eterna; e este Testamento foi selado pelo sangue da morte de Cristo. E é por isso que disse o Senhor: "Este cálice é o Novo Testamento em meu sangue, que será derramado por vós" (Lc 22, 20); como para dizer: pelo conteúdo deste cálice, celebra-se o Novo Testamento, confirmado pelo sangue de Cristo.
In I Cor, XI

II. — Existem outras utilidades do sangue de Cristo.
1. Purifica-nos de nossos pecados e imundices: "nos amou e nos lavou dos nossos pecados no seu sangue" (Ap 1, 5).
2. Garante nossa redenção. "nos resgataste para Deus com o teu sangue" (Ap 5, 9).
3. Pacifica-nos com Deus e os anjos. "pacificando, pelo sangue da sua cruz, tanto as coisas da terra como as coisas do céu" (Cl 1, 20).
4. Refrigera e inebria os que o tomam. "Bebei dele todos" (Mt 26, 28). E, noutra parte,"Levou-o às alturas da terra... e ele bebeu o mais puro sangue da uva" (Dt 32, 14).
5. Abriu as portas do céu. "Portanto, Irmãos, tendo nós confiança de entrar no Santo dos Santos pelo sangue de Cristo" (Heb 10, 19), i. é, a oração contínua dirigida a Deus em nosso proveito; pois o sangue clama a cada dia por nós, como diz são Paulo: "Vós porém aproximaste-vos do monte de Sião e da cidade de Deus vivo... e da aspersão daquele sangue que fala melhor que o de Abel" (Heb 12, 24). O sangue de Abel clamou por vingança, o de Cristo, por perdão.
6. Libertou os santos do inferno, conforme aquilo das Escrituras: "Quanto a ti, também, por causa do sangue da tua aliança, farei sair os teus cativos da fossa em que não há água". (Zc 9, 11).
Serm. in Dom. de Passione
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - Sto. Afonso Maria de Ligorio

CAPÍTULO XI

Pilatos mostra Jesus ao povo, dizendo: Ecce Homo!

“Pilatos saiu para fora e disse-lhes: Ecce homo” (Jo 19,5). Tendo sido Jesus novamente conduzido a Pilatos, depois de sua flagelação e coroação de espinhos, este, mirando-o e observando como estava dilacerado e desfigurado, persuadiu-se de que o povo se moveria à compaixão só com vê-lo. Por isso saiu para fora no terraço, levando consigo nosso aflito Salvador, e disse: “Ecce Homo”, como se dissesse: judeus, contentai-vos com o que já padeceu este pobre inocente, eis o homem que temíeis fazer-se vosso rei, ei-lo, contemplai a que estado está reduzido. Que temor podeis ainda ter agora que se acha num estado que não pode mais viver? Deixai-o morrer em sua casa, desde que pouco lhe resta de vida. “E Jesus saiu, tendo uma coroa de espinhos e uma veste purpúrea” (Jo 19,15). Olha também, minha alma, para aquele terraço e vê teu Senhor amarrado e conduzido por um carrasco: vê como está meio nu, ainda que coberto de chagas e de sangue, com as carnes dilaceradas, com aquele pedaço de púrpura que lhe serve unicamente de ludíbrio e com aquela horrenda coroa que o atormenta sem cessar. Contempla a que foi reduzido teu pastor para te encontrar a ti, ovelha desgarradas. Ah, meu Jesus, sob quantos aspectos os homens vos fazem aparecer, mas todos são de dor e vitupério. Ah, doce Redentor, vós causais compaixão até às feras, só entre os homens não encontrais piedade. Pois eis aqui o que responde essa gente: “Ao verem-no, os pontífices e ministros clamavam dizendo: Crucifica-o, crucifica-o” (Jo 19,6). Mas que dirão eles no dia do juízo final, quando vos virem glorioso, sentado como juiz num trono de luz? Ó meu Jesus, também eu durante muito tempo exclamei: crucifica-o, crucifica-o, quando com os meus pecados vos ofendi. Agora, porém, me arrependo de todo o meu coração e vos amo acima de todos os bens, ó Deus de minha alma. Perdoai-me pelos merecimentos de vossa paixão e fazei que naquele dia eu vos veja aplacado e não irritado contra mim.

Do terraço Pilatos mostra Jesus aos judeus e diz: “Ecce Homo”. Ao mesmo tempo o Padre eterno, do alto do céu, nos convida a contemplar Jesus Cristo naquele estado e diz também: “Ecce Homo”. Ó homens, este homem que vedes tão ferido e vilipendiado é meu Filho bem amado, que por vosso amor, e para pagar por vossos pecados sofre dessa maneira. Contemplai-o, agradecei-lhe e amai-o. Meu Deus e meu Pai, vós me dizeis que eu devo contemplar o vosso Filho; eu, porém, vos peço que vós o contempleis por mim; contemplai-o e por amor desse vosso Filho tende piedade de mim.

Vendo os judeus que Pilados, apesar de seus clamores, procurava dar liberdade a Jesus (Jo 19,12), pensaram em obrigá-lo a condenar o Salvador, afirmando que, se não o fizesse, seria declarado inimigo de César: “Os judeus, porém, clamavam dizendo: se soltares a este, não és amigo de César: todo o que se faz rei contradiz a César” (Jo 19,12). E de fato acertaram, porque Pilatos, temendo perder as boas graças de César, toma consigo a Jesus Cristo, assenta-se para dar a sentença e condená-lo: “Pilatos, tendo ouvido estas palavras, trouxe Jesus para fora e assentou-se no seu tribunal” (Jo 19,13). Atormentado, entretanto, pelos remorsos de sua consciência, sabendo que ia condenar um inocente, volta-se novamente para os judeus: “E disse-lhes: Eis o vosso rei”. Pois então hei de condenar o vosso rei? “Eles, porém, clamavam: Tira-o, tira-o, crucifica-o” (Jo 1,14 e 15). Replicaram os judeus mais enfurecidos que na primeira vez: Depressa, Pilatos, que nosso rei, que rei, que rei esse? tira-o, tira-o, retira-o de nossos olhos e faze-o morrer crucificado. Ah, meu Senhor, Verbo encarnado, viestes do céu à terra para conversar com os homens e para salvá-los e estes não podem mais nem sequer ver-vos entre eles e tanto se esforçam para dar-vos a morte e não mais vos ver. Pilatos ainda lhes resiste e replica: “Hei então de crucificar vosso rei? Os pontífices responderam: Não temos outro rei senão César” (Jo 19,15). Ah, meu adorável Jesus, eles não querem reconhecer-vos por seu Senhor e afirmam não ter outro rei senão César. Eu vos confesso por meu rei e Deus e protesto que não quero outro rei para meu coração senão vós, meu Redentor. Infeliz de mim, houve um tempo em que me deixei também dominar por minhas paixões e vos expulsei de minha alma, meu rei divino. Agora quero que só vós reineis nele, ordenai e ela vos obedecerá. Dir-vos-ei com S. Teresa: “Ó amante Jesus, que me amais acima do que eu posso compreender, fazei que minha alma vos sirva mais segundo o vosso gosto que o dela. Morra, pois, o meu eu e em mim viva um outro que não eu. Ele viva e me dê vida. Ele reine e eu seja escravo, não querendo minha alma outra liberdade”. Oh, feliz a alma que pode dizer em verdade: Meu Jesus, vós sois o meu único rei, meu único bem, meu único amor.

quinta-feira, 23 de março de 2023

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

30. Quinta-feira depois do IV domingo da Quaresma: A morte de Lázaro

Quinta-feira da IV semana da Quaresma

«Nosso amigo Lázaro dorme» (Jo 11, 11)
I. Chamamos alguém de "Nosso amigo", por causa dos numerosos benefícios e serviços que nos prestou; é por isso que não devemos faltar-lhe na necessidade. "...Lázaro dorme": essa a razão de precisarmos socorrê-lo. "Aquele que é amigo... torna-se um irmão no tempo da desventura" (Pr 17, 17). No dizer de santo Agostinho, ele dorme para o Senhor; para os homens, que não o podem ressuscitar, está morto. A palavra sono pode ser utilizada para significar muitas coisas: o próprio sono natural, as negligências, o sono da culpa, o repouso da contemplação ou da glória futura e, por vezes, a morte, como diz são Paulo, "não queremos, irmãos, que estais na ignorância acerca dos que dormem, para que não vos entristeçais como os outros, que não têm esperança" (1 Ts 4, 13). A morte é chamada de sono por causa da esperança da ressurreição. Por isso costuma-se chamá-la de "repouso" desde o tempo em que Nosso Senhor morreu e ressuscitou: "Deitei-me e adormeci" (Sl 3, 6).

II. "mas vou despertá-lo." Com isso, Jesus dá a entender que lhe é tão fácil ressuscitar Lázaro do túmulo quanto despertar alguém da cama. Nada que possa surpreender, pois é Ele quem suscita os mortos e os vivifica. Por isso disse: "Não vos admireis disso, porque virá tempo em que todos os que se encontram nos sepulcros escutarão a voz do Filho de Deus" (Jo 5, 28).

III. "vamos ter com ele". Brilha aqui a clemência de Deus, enquanto os homens, em estado de pecado e como mortos, não podem por si mesmos ir até Ele, é Ele quem os atrai, precedendo-lhes misericordiosamente, como aquilo das Escrituras: "Eu amei-te com amor eterno; por isso, mantive o meu favor para contigo" (Jr 31, 3).

IV. "Chegou, pois, Jesus, e encontrou-o já há quatro dias no sepulcro." Segundo santo Agostinho, Lázaro, morto há quatro dias, significa o pecador retido pela morte de um pecado quádruplo: o pecado original, o pecado contra a lei natural, o pecado atual contra a lei positiva, o pecado atual contra a lei do Evangelho e da graça. Ou então, pode-se dizer que o primeiro dia é o pecado do coração, cf. "tirai de diante dos meus olhos a malícia dos vossos pensamentos" (Is 1, 16); o segundo, o pecado da língua,"Nenhuma palavra má saia da vossa boca" (Ef 4, 19); o terceiro, o pecado das obras, sobre o qual diz Isaías, "cessai de fazer o mal" (Is 1, 16); o quarto dia é o pecado dos hábitos maus. De qualquer modo que se exponha o texto, o Senhor cura por vezes os mortos de quatro dias, isto é, os que transgridem a lei do Evangelho e estão presos no hábito do pecado.
In Joan, XI
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - Sto. Afonso Maria de Ligorio

CAPÍTULO X

Jesus é coroado de espinhos e tratado como rei de teatro

Então os soldados do governador, conduzindo Jesus para o pretório, reuniram em torno dele toda a corte. E despindo-o cingiram-lhe um manto carmesim e tecendo uma coroa de espinhos lha puseram sobre a cabeça e na sua mão direita uma cana” (Mt 27,27-29). Continuemos a considerar os bárbaros tormentos que os soldados fizeram nosso amabilíssimo Senhor sofrer. Reunindo toda a corte, colocam-lhe sobre os ombros uma clâmide purpúrea (era um manto velho que os soldados usavam por cima das armas) como manto real, nas mãos uma cana figurando o cetro e na cabeça um feixe de espinhos, parodiando a coroa, mas que, como um capacete, lhe cingia toda a cabeça. E já que os espinhos com a só colocação não entravam na cabeça já tão atormentada pelos golpes dos azorragues, servem-se da cana e, cuspindo-lhe ao mesmo tempo no rosto, cravam-lhe na cabeça com toda a força a tão cruel coroa: “E cuspindo- lhe tomavam a cana e lhe batiam na cabeça” (Mt 27,30).

Ó espinhos, ó criaturas ingratas, que fazeis? assim atormentais o vosso Criador? Por que, porém, invectivar os espinhos? Ó pensamentos iníquos dos homens, fostes vós que atravessastes a cabeça de meu Redentor. Sim, meu Jesus, nós com nossos consentimentos perversos tecemos a vossa coroa de espinhos. Agora eu os detesto e os odeio mais do que a morte ou outro mal qualquer. E a vós me volto novamente, humilhado, ó espinhos, consagrados pelo sangue do Filho de Deus, transpassai a minha alma e fazei-a sentir sempre a dor de ter ofendido um Deus tão bom. E vós, Jesus, meu amor, que tanto padeceis para me desprender das criaturas e de mim mesmo, fazei que eu possa dizer em verdade que não sou mais meu, mas só de vós e todo vosso. Ó meu Salvador afligido, ó Rei do mundo, a que vos vejo reduzido? a representar o papel de rei de teatro e dor: a ser o ludíbrio de toda a Jerusalém! O sangue ocorre a fluxo da cabeça transpassada do Senhor, sobre sua face e seu peito. Ó meu Jesus, eu admiro a crueldade dessa gente que não se satisfaz com vos ter esfolado dos pés até à cabeça, e agora vos atormenta com novos ultrajes e desprezos; admiro, porém, mais a vossa mansidão e o vosso amor, que tudo sofre e aceita por nós com tanta paciência. “Que injuriado não injuriava, recebendo maus tratos não fazia sequer ameaças, porém se entregava àquele que o julgava injustamente” (1Pd 2,23). Devia realizar-se a predição do profeta de que nosso Salvador devia ser saciado de dores e ignomínias: “Oferecerá a face ao que o ferir, fartar-se-á de opróbrios” (Lm 3,30).

Mas vós, soldados, não estais ainda satisfeitos? “E dobrando o joelho diante dele, motejavam dele dizendo: Eu te saúdo, rei dos judeus, e davam-lhe bofetadas” (Jo 19,3). Depois de tê-lo atormentado dessa forma e vestido como rei de teatro, ajoelhavam diante dele e o escarneciam dizendo: Nós te saudamos, ó rei dos judeus, e levantando-se com risos e escárnios, davam-lhe bofetadas. Ó Deus! a cabeça sagrada de Jesus já estava toda dolorida pelas feridas feitas pelos espinhos e por isso qualquer movimento lhe causava dores mortais e toda bofetada ou pancada lhe causava um sofrimento horrendo. Ao menos tu, minha alma, reconhece-o como supremo Senhor de tudo, como ele é em verdade, e agradece-lhe e ama-o como verdadeiro rei de dor e de amor, pois é para esse fim que ele padece e sofre por ti.

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 23  -  Olhemos primeiro para o alto e depois para nós mesmos. A infinita distância entre o azul e o abismo gera humildade.

quarta-feira, 22 de março de 2023

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 22  -  Parece-me inconcebível que qualquer pessoa que tenha inteligência e consciência possa se vangloriar.

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

29. Quarta-feira depois do IV domingo da Quaresma: O amigo divino

Quarta-feira depois do IV domingo da Quaresma

«Mandaram, pois, suas irmãs dizer a Jesus: Senhor, eis que está enfermo aquele que tu amas» (Jo 11, 3 )
Aqui há três coisas que se deve considerar:
a) A primeira é que os amigos de Deus por vezes padecem no corpo. Assim, não é sinal de falta de amizade com Deus o padecermos no corpo. Elifaz errava ao dizer a Jó, Lembra-te: que inocente pereceu jamais? ou quando foram os justos destruídos? (Jó 4, 7), como provam as irmãs de Lázaro: Senhor, eis que está enfermo aquele que tu amas. Lemos no livros dos Provérbios (3, 12): O Senhor castiga aquele a quem ama, como um pai a seu filho querido.
b) A segunda é que elas não dizem: Senhor, vinde, curai-o, mas apenas expõem o seu estado: eis que está enfermo. O que significa que basta exprimir a um amigo as nossas necessidades, sem acrescentar pedido algum; pois um amigo, assim como procura seu próprio bem e combate seus males pessoais, combaterá os males de seu amigo. E isto é sobretudo verdadeiro de quem verdadeiramente ama. Diz o salmo (144, 20): O Senhor guarda todos os que o amam.
c) A terceira é que as duas irmãs, desejando a cura de seu irmão doente, não vêm pessoalmente ao Cristo, como o fizeram o paralítico e o centurião; e isso por causa de sua confiança em Jesus Cristo, em virtude do amor especial e da familiaridade que lhes testemunhará. E talvez estivessem detidas pela dor, como disse são João Cristóstomo, em conformidade com aquilo do Eclesiástico (6, 11): Se o teu amigo perseverar firme, será para ti como um igual, tratará à vontade com os da tua casa.
In Joan, XI
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - Sto. Afonso Maria de Ligorio

CAPÍTULO IX

Jesus é flagelado numa coluna

“Pilatos então tomou Jesus e mandou açoitá-lo” (Jo 19,1). Vendo Pilatos que os dois meios empregados para não condenar aquele inocente, isto é, remetê-lo a Herodes e apresentá-lo junto com Barrabás, não tinham dado resultado, escolhe um outro meio, o de castigá-lo e depois mandá-lo embora. Convoca, pois, os judeus e diz- lhes: “Apresentastes-me este homem... e interrogando-o diante de vós não achei nele culpa alguma, nem tão pouco Herodes... Portanto, depois de castigado, o soltarei” (Lc 23,14-17). Vós me apresentastes este homem como delinqüente; eu, porém, não encontro nele crime algum, nem Herodes o descobriu. Contudo, para contentar-vos, eu o farei castigar e depois o porei em liberdade. Ó Deus, que injustiça! Ele o declara inocente e ainda assim lhe destina o castigo. Ó meu Jesus, vós sois inocente, mas não eu, e desde que quereis satisfazer por mim a justiça divina, não é injustiça mas é mesmo justo que sejais punido. Mas qual é o castigo a quem condenas esse inocente, ó Pilatos? A ser flagelado! Destinas, pois, a um inocente uma pena tão cruel e vergonhosa? Mas assim esse fez. “Pilatos se apoderou de Jesus e o mandou flagelar” (Jo 19,1). Contempla agora, minha alma, como depois dessa tão injusta sentença os carrascos se laçam com fúria sobre o manso Cordeiro e o conduzem aos gritos e alegria ao pretório e o amarram à coluna. E que faz Jesus? Ele, todo humilde e submisso, aceita por nossos pecados aquele tormento tão doloroso e ignominioso. Eis como já se armam com os azorragues e, dado o sinal, levantam o braço e começam a flagelar de todos os lados aquele corpo sacrossanto. Ó carrascos, vós vos enganastes, não é ele o réu, sou eu quem merece esses golpes. Aquele corpo virginal aparece ao princípio todo lívido e em seguida começa a jorrar sangue de todas as partes. E tendo os carnífices dilacerado todo o seu corpo, continuam impiedosamente a golpear as feridas e ajuntar dores a dores. “E sobre a dor das minhas chagas acrescentaram novas chagas” (Sl 68,27). Ó minha alma, serás tu também do número daqueles que com olhos indiferentes contemplam a Deus flagelado? Considera, sim, as dores, mas ainda mais o amor com que este teu doce Senhor padece esse grande tormento por ti. Certamente Jesus pensava em ti na sua flagelação. Ó Deus, se ele não tivesse sofrido mais que um golpe por amor de ti, deverias arder em amor por ele, dizendo: um Deus se compraz em ser flagelado por meu amor! Ele, porém, chega, por teus pecados, a se deixar dilacerar todas as carnes, como já o predissera Isaías: “Ele, porém, foi vulnerado por causa de nossas iniqüidades” (Is 53,5). Além disso, segundo o mesmo profeta, o mais belo de todos os homens já não tem mais beleza. “Não existe nele beleza nem formosura: nós o vimos e ele não tinha mais aparência” (Is 53,2). Os flagelos o deformaram tanto que se não o conhece mais. “O seu rosto se achava como encoberto e parecia desprezível e por isso nenhum caso fizemos dele” (Is 53,3). Ficou reduzido a um estado miserável, que parecia um leproso coberto de chagas dos pés até à cabeça: “Nós o reputamos como um leproso e ferido por Deus e humilhado” (Is 53,4). E por que isso? porque nosso amante Redentor quis sofrer aquelas penas que nos eram devidas: “Verdadeiramente ele foi o que tomou sobre si as nossas fraquezas e ele mesmo carregou com as nossas dores” (Is 53,4). Seja para sempre louvada a vossa bondade, ó meu Jesus, que quisestes ser tão atormentado para livrar-me dos tormentos eternos. Oh! pobre e infeliz do que não vos ama, ó Deus de amor.

Mas, enquanto os carrascos o flagelam tão cruelmente, que faz nosso amável Salvador? Ele não fala, não se lamenta, não suspira; mas com toda a paciência oferece tudo a Deus para torná-lo misericordioso em nosso favor: “Como Cordeiro mudo ante o que o tosquia, assim não abriu ele a sua boca” (At 8,32). Ah, meu Jesus, inocente cordeiro, esses bárbaros não vos cortam a lã, mas a pele e as carnes. Mas esse é o batismo de sangue que durante vossa vida tanto haveis desejado: “Tenho de ser batizado com um batismo e em que ansiedade me sinto eu até que ele se cumpra” (Lc 12,50). Levanta-te, minha alma, e lava-te naquele sangue precioso em que está toda banhada aquela terra afortunada. E como poderei eu, meu doce Salvador, duvidar do vosso amor, vendo-vos todo chagado e dilacerado por mim? Sei que cada uma de vossas chagas é um testemunho certíssimo do afeto que me tendes. Sinto que cada uma de vossas feridas me pede amor. Bastaria uma só gota de vosso sangue para me salvar, mas vós quisestes dá-lo todo, sem reserva, para que eu sem reserva me dê todo a vós. Sim, meu Jesus, eu me dou todo a vós sem reserva, aceitai-me e ajudai-me a vos ser sempre fiel.

terça-feira, 21 de março de 2023

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 21  -  Procure conformar-se com a vontade de Deus sempre e em tudo, e não tenha medo. 

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

28. Terça-feira depois do IV domingo da Quaresma: O exemplo de Cristo crucificado

terça-feira depois do IV domingo da Quaresma

Nosso Senhor assumiu a natureza humana para reparar a queda do homem. Por isso, foi necessário que Cristo padecesse e vivesse conforme a natureza humana, como remédio à queda do pecado. Ora, o pecado do homem consistiu em ter o homem se apegado aos bens corporais e se desinteressado dos espirituais. Convinha, pois, ao Filho de Deus, por tudo que fez e sofreu na natureza humana que assumira, mostrarse de modo tal, que fizesse os homens terem por nada os bens e os reveses do século, abandonarem o apego desordenado e se devotarem aos bens espirituais.
Foi por isso que Cristo quis nascer de pais pobres, mas perfeitos em virtude, para nos ensinar a não nos gloriarmos da nobreza da carne, ou da riqueza dos pais. Ele viveu uma vida pobre, para ensinar o desprezo das riquezas. Viveu sem honrarias, para arrancar os homens da cobiça desordenada delas. Suportou os trabalhos, a sede, a fome, os tormentos corporais, para que os homens, desejosos de prazeres e delícias, não se deixassem desviar do bem da virtude pelas misérias desta vida.
Por fim, era conveniente que o Filho de Deus humanado morresse, a fim de que, por temor da morte, não abandonássemos a via da virtude. E, para que não temêssemos a morte ignominiosa, escolheu a pior das mortes, a morte na Cruz. Também foi conveniente que o Filho de Deus humanado sofresse a morte, a fim de que, por seu exemplo, fossemos estimulados à virtude, e para que fossem verdadeiras as palavras de são Pedro: Cristo também sofreu por nós, deixando-vos o exemplo, para que sigais as suas pisadas. (1 Pd 2, 21)
Contra Armen. Sarac., VII
Mas, Cristo também sofreu por nós, deixando-vos o exemplo da tribulação, dos ultrajes, da flagelação, da cruz, da morte, para que marchássemos sobre suas pegadas. Se suportarmos por Cristo tribulações e sofrimentos, também reinaremos com ele na eterna beatitude. Diz são Bernardo: "Como são poucos, ó Senhor, os que vos querem seguir, apesar de todos quererem estar convosco e saberem que as beatitudes estarão ao vosso lado até o fim. Ora, todos querem fruir de vós, mas não vos querem imitar; querem reinar, mas não padecer convosco; não vos procuram, mas vos querem encontrar; desejam conseguir, mas não seguir".
De humanitate Christi, cap. 47
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - Sto. Afonso Maria de Ligorio

CAPÍTULO VIII

Jesus é conduzido a Pilatos e daí a Herodes, sendo-lhe Barrabás preferido

“Chegada a manhã, entraram em conselho contra Jesus para entregá-lo à morte, e preso o conduziram e entregaram ao governador Pôncio Pilatos” (Mt 27,1-2). Pilatos, depois de muita interrogações, feitas ora aos judeus ora ao Salvador, conhece que Jesus era inocente e que as acusações eram unicamente calúnias. Por isso, sai fora e diz aos judeus que não encontra motivo para condenar aquele homem (Jo 18,38). Vendo, porém, os judeus tão empenhados em dar a morte e ouvindo que Jesus era da Galiléia, para sair-se do embaraço, remeteu-o a Herodes (Lc 23,7). Herodes sentiu uma grande alegria por ter diante de si a Jesus Cristo, esperando presenciar algum dos muitos prodígios feitos pelo Senhor, como lhe haviam relatado. Pôs-se, pois, a crivá-lo de perguntas. Jesus, porém, se cala e nada responde, repreendendo assim a vã curiosidade daquele temerário (Lc 23,9). Pobre da alma à qual o Senhor não fala mais. Meu Jesus, era isso que eu merecia, depois de me haverdes chamado tantas vezes ao vosso amor com tantas vozes piedosas e eu não vos ter dado ouvido. Mereceria, sim, que não me falásseis mais e me abandonásseis: não o façais, porém, meu caro Redentor; tende piedade de mim e falai-me: “Falai, Senhor, porque vosso servo vos escuta”. Dizei-me, Senhor, o que quereis de mim, que eu quero obedecer-vos em tudo e contentar-vos.

Mas, vendo Herodes que Jesus não lhe respondia, desprezou-o e, tratando-o de louco, mandou que o revestissem com uma veste branca e o ludibriou, no que foi acompanhado por sua corte inteira, e assim vilipendiado e encarnecido o reenviou a Pilatos. “Herodes, porém, com os da sua guarda, desprezou-o e fez escárnio dele, e, mandando vesti-lo com uma túnica branca, o reenviou a Pilatos” (Lc 23,11). Jesus é então levado pelas ruas de Jerusalém, revestido com aquela veste de escárnio. Ó meu Jesus, desprezado, ainda faltava esta injúria: ser tratado como louco! Ó cristãos, contemplai como o mundo trata a Sabedoria eterna! Bem-aventurado aquele que se preza de ser tratado como louco pelo mundo e não quer saber de nada mais senão de Jesus crucificado, amando os sofrimentos e desprezos e dizendo com S. Paulo: “Porque não entendi eu saber entre vós coisa alguma senão a Jesus Cristo e este crucificado” (1Cor 2,2).

O povo hebreu tinha o direito de pedir ao governador romano a libertação de um réu na festa da Páscoa. Por isso Pilatos propõe-lhe Jesus e Barrabás, dizendo: “A quem quereis que eu solte, a Barrabás ou a Jesus?” (Mt 27,21). Pilatos esperava certamente que o povo preferisse Jesus a Barrabás, homem celerado, homicida e ladrão público, odiado por todos. Mas o povo, instigado pelos chefes da sinagoga, pede, de repente, sem nenhuma deliberação, a Barrabás. “E eles disseram: Barrabás”. Pilatos, surpreendido e ao mesmo tempo indignado, vendo preferido um tão grande celerado a um inocente diz: “Que hei então de fazer de Jesus? Todos responderam: Seja crucificado. E Pilatos: Mas que mal fez ele? E eles gritavam ainda mais: seja crucificado” (Mt 27,23). Ah, Senhor, assim procedi eu quando pequei: eu me propunha então que coisa era preferível, ou renunciar a vós ou àquele vil prazer. E eu respondia: Quero o prazer e não me incomodo de perder a Deus. Assim disse eu então, meu Senhor. Agora, porém, digo que prefiro a vossa graça a todos os prazeres e tesouros do mundo. Ó bem infinito, ó Jesus, eu vos amo acima de todos os bens: só a vós quero e nada mais.

Assim como foram propostos ao povo Jesus e Barrabás, do mesmo modo foi proposto ao eterno Padre quem ele queria livre, seu filho ou o pecador. O eterno Pai responde: Morra meu Filho e salve-se o pecador. É o que atesta o Apóstolo: “Não poupou seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós” (Rm 8,32). Sim, a tal ponto, diz o próprio Salvador, amou Deus o mundo que para salvá-lo entregou aos tormentos e à morte seu Filho unigênito (Jo 3,16). Por isso exclama a Igreja: Ó admirável condescendência de vossa piedade! Ó inapreciável predileção de vossa caridade! para remirdes o escravo, entregastes o Filho! (Hino Exultet). Ó santa fé de um homem que crê essas coisas, como poderá deixar de ser todo fogo para amar um Deus que ama tanto as criaturas! Oh! tivesse eu sempre diante dos olhos esta imensa caridade de Deus.

segunda-feira, 20 de março de 2023

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 20  -  Que o doce Jesus repouse sempre no seu coração. Que Ele o deixe sempre repousar a Seus pés e seja a sua força.

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

27. Segunda-feira depois do IV domingo da Quaresma: Cristo mereceu, pela sua paixão, ser exaltado

segunda-feira depois do IV domingo da Quaresma

«Ele tornou-se obediente até a morte, e morte de cruz; para o qual Deus também o exaltou.» (Fl 2, 8)
O mérito comporta certa igualdade com a justiça. Por isso, diz o Apóstolo que "para aquele que realiza obras, o salário é considerado um débito" (Rm 4,4). Quando alguém, por sua injusta vontade, atribui a si mais do que se lhe deve, é justo que se diminua também o que se lhe devia, como diz o livro do Êxodo (22): "Quando um homem roubar uma ovelha, devolva". E dizemos que ele o mereceu, porquanto desse modo se pune sua vontade injusta. Assim também, quando alguém, por uma justa vontade, se priva do que tinha direito de possuir, merece que se lhe dê mais, como salário de sua vontade justa. Por isso, como diz o Evangelho de Lucas, "quem se humilha será exaltado" (Lc 14, 11).
 
I. Ora, Cristo, em sua paixão, de quatro modos se humilhou abaixo de sua dignidade:
a) Primeiro, em relação à sua paixão e morte, de que não era devedor.
b) Segundo, em relação ao local, pois seu corpo foi posto num sepulcro, e sua alma, na mansão dos mortos.
c) Terceiro, em relação à confusão e opróbrios que suportou.
d) Quarto, em relação ao fato de ter sido entregue ao poder dos homens, conforme ele mesmo disse a Pilatos: "Não terias poder algum sobre mim se não te houvesse sido dado do alto" (Jo 19, 11).

II. Por sua paixão, mereceu a exaltação de quatro maneiras:
a) Primeiro, em relação à ressurreição gloriosa. Por isso, diz o salmo (138, 1): "Conheces o meu deitar", ou seja, a humilhação de minha paixão, "e o meu levantar".
b) Segundo, em relação à ascensão ao céu. Por isso, diz a Carta aos Efésios: "Desceu primeiro até as partes inferiores da terra. Aquele que desceu é também o que subiu mais alto que todos os céus" (Ef 4, 9-10).
c) Terceiro, em relação ao assento que teve à direita do Pai e à manifestação de sua divindade, conforme diz Isaías: "Ele será exaltado, elevado, e posto muito alto, da mesma forma que as multidões ficaram horrorizadas a seu respeito assim será sem glória o seu aspecto entre os homens" (52, 13-14). E diz a Carta aos Filipenses (2, 8-10): "Ele se fez obediente até a morte e morte numa cruz. Foi por isso que Deus lhe conferiu o Nome que está acima de todo nome", ou seja, para que por todos seja considerado como Deus e todos lhe mostrem reverência como a um Deus. E é o que se acrescenta: "A fim de que ao nome de Jesus todo joelho se dobre, nos céus, na terra e debaixo da terra".
d) Quarto, em relação ao poder judiciário, pois diz o livro de Jó: "Tua causa foi julgada como a de um ímpio. Receberás o juízo e a causa" (Jó 36, 17).
III, q. XLIX, a. 6

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - Sto. Afonso Maria de Ligorio

CAPÍTULO VII

Jesus é apresentado aos pontífices e por eles condenado à morte

“Eles, apoderando-se de Jesus, o conduziram a Caifás, príncipe dos sacerdotes, onde os escribas e anciãos se haviam congregado” (Mt 26,57). Amarrado como um malfeitor, entra em Jerusalém nosso Salvador, onde poucos dias antes entrara aclamado com tantas honras e louvores. Atravessa ele de noite a estrada, entre lanternas e tochas, e tão grande era o rumor e o tumulto, que fazia crer que se conduzia preso algum famoso malfeitor. Chegam-se pessoas à janela e perguntam quem é o prisioneiro. E a resposta é: Jesus Nazareno, que se descobriu ser um sedutor, um impostor e falso profeta, merecedor da morte. Quais foram então os sentimentos de desprezo e desdém de todo o povo, vendo Jesus Cristo, que ele acolhera como o Messias, aprisionando por ordem dos juízes como impostor. OH! como se transformou em ódio a veneração de cada um que se arrependia de o haver homenageado, envergonhando-se de ter tomado pelo Messias a um malfeitor.

Eis como o Redentor é apresentado quase em triunfo a Caifás, que sem dormir o espera, e, vendo-o na sua presença, só e abandonado de todos os seus, sumamente se alegra. Contempla, minha alma, teu doce Salvador, como se mostra todo humilde e manso diante daquele soberbo pontífice, estando amarrado como um criminoso e com os olhos baixos. Contempla aquela bela face, que no meio de tantos desprezos e injúrias não perdeu sua natural serenidade e doçura. Ah, meu Jesus, agora que vos vejo cercado, não de anjos que vos louvam, mas dessa plebe vil que vos odeia e despreza, que farei? continuarei talvez a desprezar-vos como foi no passado? Ah, não. Na vida que me resta quero estimar-vos e amar-vos como mereceis e vos prometo não amar ninguém fora de vós. Vós sereis meu único amor, meu bem, meu tudo. Meu Deus e meu tudo.

O ímpio pontífice interroga Jesus sobre seus discípulos e sobre sua doutrina, para descobrir um motivo para condená-lo. Jesus humildemente lhe responde: “Eu lhe falei publicamente ao mundo... Pergunta àqueles que ouviram o que eu lhes disse: Ei-los aí, eles sabem o que eu ensinei” (Jo 18,20-21). Eu não falei em segredo, falei em público: os que estão ao redor de mim podem atestar o que eu disse: Aduz por testemunhas seus próprios inimigos. Mas, depois de uma resposta tão acertada e tão mansa, se precipita do meio daquela chusma um algoz mais insolente, que, tratando-o de temerário, lhe dá uma forte bofetada, dizendo: “É assim que respondes ao pontífice?” (Jo 18,22). Ó Deus, então uma resposta tão humilde e modesta merecia uma afronta tão grande? O indigno pontífice o vê, mas em vez de repreender aquele carrasco, cala-se e com seu silêncio bem aprova o que ele fizera. Jesus, diante de tal injúria, para isentar-se da culpa de falta de respeito ao pontífice, diz: “Se falei mal, dá testemunho do mal, mas se falei bem, por que me bates?” (Jo 18,23). Ah, meu amável Redentor, vós sofreis tudo para pagar as afrontas que eu fiz à divina majestade com os meus pecados. Ah, perdoai-me, pelo merecimento desses mesmos ultrajes que por mim sofrestes. “Procuravam um falso testemunho contra Jesus, para o condenarem à morte: mas não achavam” (Mt 26,59). Buscam um testemunho para condenar a Jesus e, não o encontrando, o pontífice busca novamente nas palavras de nosso Salvador um motivo para declará-lo réu e por isso diz-lhe: “Eu te conjuro por Deus vivo que nos digas se tu és o Cristo, Filho de Deus” (Mt 26,63). O Senhor, vendo-se instado em nome de Deus, confessa a verdade e responde: “Eu o sou, e vereis o Filho do homem sentado à destra do poder de Deus e vindo sobre as nuvens do céu” (Mc 14,62). Eu o sou, e um dia me vereis, não assim desprezível como agora vos pareço, mas num trono de majestade, sentado como juiz de todos os homens, sobre as nuvens do céu. Ao ouvir isso, o pontífice, em vez de lançar-se com o rosto em terra para adorar seu Deus e seu juiz, rasga suas vestes e exclama: “Blasfemou, que necessidade temos ainda de testemunhas? eis aí acabais de ouvir a blasfêmia! Que vos parece?” (Mt 26,65-66). Responderam todos os sacerdotes que sem dúvida alguma era digno de morte: “E eles em resposta disseram: É réu de morte” (Mt 26,66). Ah, meu Jesus, a mesma sentença proferiu vosso eterno Pai, quando vos oferecestes para pagar por nossos pecados: desde que meu Filho quer satisfazer pelos homens, é réu de morte e deve morrer.

Então lhe cuspiram no rosto e lhe deram bofetadas, outros lhe descarregara as mãos na face, dizendo: Adivinha-nos, ó Cristo, quem foi que te bateu?” (Mt 26,67-68). Puseram-se todos a maltratá-lo como a um malfeitor já condenado à morte e digno de todos os vitupérios: este lhe escarra no rosto, aquele lhe dá punhadas, mais um outro lhe dá bofetadas e, cobrindo-lhe o rosto com um pano, como acrescenta S. Marcos (13,65), o escarnecem como falso profeta e dizem-lhe: Pois que és profeta, adivinha lá quem agora te bate. S. Jerônimo escreve que foram tantos os ludíbrios e as irrisões a que sujeitaram o Senhor naquela noite, que somente no dia de juízo serão todos eles conhecidos.

Portanto, ó meu Jesus, não repousastes naquela noite, mas fostes o objeto da mofa e meus traços daquela gentalha. Ó homens, como podeis contemplar um Deus tão humilhado e ser soberbos? como podeis ver vosso Redentor padecer tanto por vós e não amá-lo? Ó Deus, como é possível que aquele que crê e considera as dores e ignomínias (mesmo só as narradas nos santos evangelhos) sofridas por Jesus por nosso amor, possa viver sem se abrasar em amor por um Deus tão benigno e tão amoroso para conosco?

Aumenta a dor de Jesus o pecado de Pedro, que o renega e jura não haver conhecido. Vai, minha alma, vai àquele cárcere em busca de teu Senhor, tão aflito, escarnecido e abandonado e agradece-lhe e consola-o com teu arrependimento, já que tu durante tanto tempo também o desprezastes e renegaste. Dize-lhe que desejarias morrer de dor, pensando que no passado tanto amarguraste o seu doce coração, que tanto te amou. Dize-lhe que agora o amas e nada mais desejas senão sofrer e morrer por seu amor. Ah, meu Jesus, recordai-me dos desgostos que vos dei e olhai-me com um olhar amoroso como olhastes para Pedro, depois de vos haver renegado; o que fez que ele nunca mais deixasse de chorar o seu pecado até ao fim de sua vida.

Ó grande Filho de Deus, ó amor infinito, que padeceis por aqueles mesmos homens que vos odeiam e maltratam. Vós sois a glória do paraíso, muita honra teríeis feito aos homens se os admitísseis somente a beijar-vos os pés. Mas, ó Deus, quem vos arrastou a essa determinação tão ignominiosa de vos tornar o joguete da gente mais vil do mundo? Dizei-me, ó meu Jesus, que posso eu fazer para compensar-vos a honra que esses vos roubam com seus opróbrios? Sinto que me respondeis: Suporta os desprezos por amor de mim, como eu os suportei por ti. Sim, meu Redentor, quero obedecer-vos. Meu Jesus, desprezado por amor de mim, eu só quero e desejo ser desprezado por amor de vós, quanto vos aprouver.

domingo, 19 de março de 2023

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

26. Quarto domingo da Quaresma: Cristo com sua paixão abriu a porta do céu

IV Domingo da Quaresma

«Portanto, irmãos, tenham confiança de entrar no Santuário pelo sangue de Cristo.» (Hb 10, 19)
O fechamento de uma porta é um obstáculo que impede a entrada das pessoas. Ora, os homens estavam impedidos de entrar no reino dos céus por causa do pecado, pois, como diz Isaías (25, 8): "Caminho sagrado chamá-loão. O impuro não passará por ele". E há dois pecados que impedem a entrada do reino dos céus. Um é o pecado de nosso primeiro pai, pecado comum a toda a natureza humana e que fechava ao homem a entrada do reino celeste. Por isso, se lê no livro do Gênesis, que, depois do pecado do primeiro homem, "Deus postou os querubins com uma espada de fogo e versátil, para guardar o caminho da árvore da vida". O outro é o pecado especial de cada pessoa, cometido pelo ato pessoal de cada homem.
Pela paixão de Cristo somos libertados não só do pecado comum a toda a natureza humana, em relação à culpa e em relação à dívida da pena, uma vez que ele pagou por nós o preço, mas também dos pecados próprios de cada um dos que participam da paixão dele pela fé, pelo amor, e pelos sacramentos da fé. Consequentemente, pela paixão de Cristo foi-nos aberta a porta do reino celeste. E é precisamente isso que nos diz a Carta aos Hebreus (9, 11): "Cristo, sumo sacerdote dos bens vindouros, por seu próprio sangue, entrou uma vez para sempre no santuário e obteve uma libertação definitiva". É o que dá a entender o livro dos Números quando diz que o homicida "ali permanecerá", ou seja, na cidade de refúgio, "até a morte do sumo sacerdote consagrado com o óleo santo" (Nm 35, 25); depois da morte deste, voltará para sua casa.
Deve-se dizer que os Patriarcas, ao realizarem obras de justiça, mereceram entrar no reino celeste pela fé na paixão de Cristo, segundo o que diz a Carta aos Hebreus (Hb 11, 33): "Graças à fé, conquistaram reinos, praticaram a justiça"; por ela, cada um deles ficava limpo do pecado, quanto condiz com a purificação da própria pessoa. Contudo a fé ou a justiça de nenhum deles era suficiente para remover o impedimento proveniente da dívida de todas as criaturas humanas. Impedimento que foi removido pelo preço do sangue de Cristo. Por isso, antes da paixão de Cristo, ninguém pudera entrar no reino celeste, ou seja, conseguir a eterna bem-aventurança, que consiste no pleno gozo de Deus. Cristo, com sua paixão, mereceu-nos a abertura do reino celeste e removeu o impedimento; mas pela ascensão como que nos introduziu na posse do reino celeste. Por isso, se diz que "já subiu, diante deles, aquele que abre o caminho"
(Mq 2, 13).
III, q. XLIX, a. 5

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - Sto. Afonso Maria de Ligorio

CAPÍTULO VI

Jesus é preso e amarrado

“Levantai-vos, vamos: eis que já está perto quem me há de trair” (Mc 14,42). Sabendo o Redentor que Judas juntamente com os judeus e soldados que o vinham prender já estavam perto, levanta-se ainda banhado no suor da morte, e com o rosto pálido mas com o coração tão inflamado em amor, vai ao seu encontro para entregar-se em suas mãos, e, vendo-os reunidos, pergunta-lhes: “A quem buscais?” Imagina, minha alma, que Jesus te pergunta do mesmo modo: Dize-me, a quem buscas? Ah, meu Senhor, a quem eu procuro senão a vós, que viestes do céu à terra em busca de mim, para que me não perdesse?

“Prenderam a Jesus e o ligaram” (Jo 18,13). Ó céus, um Deus amarrado! Que diríamos, se víssemos um rei preso e acorrentado por seus criados! E que devemos dizer então, vendo um Deus entregue às mãos da gentalha? Ó cordas felizes, vós que ligastes o meu Redentor, prendei-me também a ele, mas prendei-me de tal modo que eu não possa separar-me mais de seu amor; prendei o meu coração à sua vontade santíssima, para que de agora em diante não queira nada mais senão o que ele quer.

Contempla, minha alma, como uns lhe põe as mãos, outros o ligam, estes o injuriam, aqueles o batem, e o Cordeiro inocente se deixa atar e esbofetear à vontade deles. Não procura fugir de suas mãos, não pede auxílio, não se queixa de tantas injúrias, não pergunta por que o maltratam assim. Eis realizada a profecia de Isaías: “Foi oferecido porque ele o quis e não abriu sua boca, como uma ovelha será conduzido ao matadouro” (Is 53,7). Não fala e não se lamenta, porque ele mesmo já se oferecera à justiça para satisfazer e morrer por nós e assim deixou-se conduzir à morte qual ovelha, sem abrir a boca.

Olha como, preso e circundado por aquele populacho, é arrastado do horto e conduzido às pressas aos pontífices na cidade. E onde estão seus discípulos? que fazem? Se, não podendo livrá-lo das mãos de seus inimigos, ao menos o acompanhassem para defender sua inocência diante dos juízes, ou então para consolá-lo com sua presença! Mas não. O evangelho diz: “Então seus discípulos, abandonando-o, fugiram todos” (Mc 14,50). Que dor não sentiu então Jesus, vendo-se abandonado e deixado até por aqueles que lhe eram caros! Jesus viu então todas as almas que, mais favorecidas por ele, deveriam depois abandoná-lo e voltar-se ingratamente as costas. Ah, meu Senhor, minha alma foi uma dessas infelizes que, depois de tantas graças, luzes e convites recebidos de vós, esqueceram-se ingratamente de vós e vos abandonaram. Recebei-me, por piedade, agora que arrependido e contrito a vós me volto para não vos deixar mais, ó tesouro, ó vida, ó amor de minha alma.

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 19  -  Que São José sempre interceda pela integridade de todas as famílias, da mesma forma que protegeu a Sagrada Família.

sábado, 18 de março de 2023

Padre Pio - Frases para cada dia do ano

Dia 18 - Quando julgar alguém, seja extremamente caridoso.

Meditações para a Quaresma - Santo Tomás de Aquino

25. Sábado depois do III domingo da Quaresma: Pela Paixão fomos reconciliados com Deus

Sábado da terceira semana da Quaresma

«Fomos reconciliados com Deus pela morte de seu Filho.» (Rm 5, 10)
Pela Paixão de Cristo fomos liberados do reato da pena de dois modos:

I. — A Paixão de Cristo é a causa de nossa reconciliação com Deus, de dois modos.
Primeiro porque remove o pecado pelo qual os homens são constituídos inimigos de Deus, segundo aquilo da Escritura (Sb 14, 9): Deus igualmente aborreceu ao ímpio e a sua impiedade. E noutro lugar (Sl 5, 7): Aborreces a todos os que obram a iniqüidade. De outro modo, como sacrifício muito aceito de Deus; assim como perdoamos uma ofensa cometida contra nós quando recebemos um serviço que nos é prestado. Donde o dizer a Escritura (1 Rs 26, 19): Se o Senhor te incita contra mim, receba ele o cheiro do sacrifício. Semelhantemente, o ter Cristo sofrido voluntariamente foi um bem tão grande, que em razão desse bem descoberto em a natureza humana, Deus se aplacou no tocante a qualquer ofensa do gênero humano, contanto que o homem se una com a Paixão de Cristo, segundo a fé e a caridade. Não se diz que a Paixão de Cristo nos reconciliou com Deus porque de novo nos começasse a amar, pois está na Escritura (Jr 31, 3): Com amor eterno te amei. Mas porque a Paixão de Cristo eliminou a causa do ódio, quer por ter delido o pecado, quer pela compensação de um bem mais aceitável.
IIIa q. XLIX a. 4

II. — Se pensarmos naqueles que O lançaram à morte, a Paixão de Cristo foi verdadeiramente uma causa de indignação. Mas, a caridade de Cristo padecendo foi maior que a iniqüidade dos homens. Por isso a Paixão de Cristo é mais eficaz para reconciliar com Deus todo o gênero humano que para provocar sua cólera. O amor de Deus por nós se revela nos seus efeitos. Dizemos que Deus faz participar de sua bondade aqueles que ama. Ora, a maior e mais completa participação na sua bondade consiste na visão da sua essência, pela qual privamos com Ele como amigos, pois a beatitude consiste nesta serenidade. Assim, pode-se dizer simplesmente que Deus ama a quem admite a esta visão, quer pelo dom real, quer pelo dom da causa — como ocorre com aqueles a quem Deus deu o Espírito Santo como penhor desta visão. Pelo pecado, porém, ao homem foi retirada esta participação na bondade divina, ou seja, a visão de sua essência; e sob este aspecto, diz-se que o homem estava privado do amor de Deus. Ora, após Cristo ter satisfeito por nós pela sua Paixão, e conseguido que fossemos readmitidos à visão de Deus, diz-se que nos reconciliou com Deus.
2 Dist. 19, q. I, a. 5
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo - Sto. Afonso Maria de Ligorio

CAPÍTULO V

Jesus ora no horto e sua sangue

“E tendo dito o hino, saíram para o monte das Oliveiras... Então Jesus foi com eles a uma granja chamada Getsêmani” (Mt 26,30). Tendo feito a ação de graças depois da ceia, Jesus deixa o cenáculo com seus discípulos, entra no horto de Getsêmani e se põe a orar; mal, porém, começa a orar assaltam-no ao mesmo tempo um grande temor, um grande tédio e uma grande tristeza, diz S. Marcos (14,33). E S. Mateus ajunta: “Começou a entristecer-se e ficar angustiado”. Oprimido por essa tristeza, nosso Redentor diz que sua alma está aflita até a morte (Mc 14,34). Passou-lhe então diante dos olhos toda a cena funesta dos tormentos e dos opróbrios que lhe estavam preparados. Esses tormentos o oprimiram durante sua paixão cada um por sua vez, sucessivamente, mas aqui no horto todos juntos e ao mesmo tempo o afligiram, as bofetadas, os escarros, os flagelos, os espinhos, os cravos e os vitupérios que teria de sofrer depois. Jesus os abraça todos juntos, mas, aceitando-os, sua natureza treme, agoniza e ora: “Estando em agonia, orava com mais instância” (Lc 22,43). Mas, ó meu Jesus, quem vos obriga a sofrer tantas penas? É o amor que tenho aos homens, responde Jesus. Oh! como o céu terá pasmado vendo a fortaleza tornar-se fraca, a alegria do paraíso se entristecer. Um Deus aflito! E por quê? Para salvar os homens, suas criaturas. Naquele horto se consumou o primeiro sacrifício: Jesus foi a vítima, o amor foi o sacerdote e o ardor de seu afeto para com os homens foi o fogo bem-aventurado que consumia o sacrifício.

“Meu Pai, se for possível, passe de mim este cálice” (Mt 26,39). Assim suplica Jesus. Ele, porém, assim suplica não tanto para ver-se livre como para nos fazer compreender a pena que sofre e aceita por nosso amor. Suplica também assim para nos ensinar que nas tribulações podemos pedir a Deus que nos livre delas, mas, ao mesmo tempo, devemos em tudo nos confortar com sua divina vontade e dizer como ele: “Contudo não se faça o que eu quero, mas como vós quereis” (Mt 26,39). Sim, meu Senhor, eu abraço por vosso amor todas as cruzes que quiserdes enviar-me. Vós inocentemente tanto sofrestes por meu amor e eu, pecador, depois de haver merecido tantas vezes o inferno, recusarei sofrer para vos comprazer e alcançar de vós o perdão e a vossa graça? Não seja feita a minha vontade, mas a vossa.

“Prostrou-se em terra” (Mc 14,35). Jesus naquela oração prostrou-se com a face na terra, porque, vendo-se coberto com a veste sórdida de todos os nossos pecados, se envergonhara de levantar o rosto para o céu. Meu caro Redentor, não teria coragem de pedir-vos perdão de tantas injúrias que vos fiz, se os vossos sofrimentos e méritos não me dessem confiança. Padre eterno, olhai para a face de vosso Cristo; não olheis as minhas iniqüidades, olhai esse vosso Filho querido, que treme, que agoniza, que sua sangue para obter-me de vós o perdão. “E seu suor se fez como gotas de sangue correndo sobre a terra” (Lc 22,44). Contemplai-o e tende piedade de mim. Mas, ó meu Jesus, nesse jardim não existem carnífices que vos flagelem, nem espinhos, nem cravos: e que vos faz derramar tanto sangue? ah, eu compreendo, não foi tanto a previsão dos sofrimentos iminentes que então vos afligiu, pois já vos havíeis oferecido para sofrer essas penas: Foi oferecido porque ele mesmo o quis (Is 53,7), mas foi a vista de meus pecados: eles foram a prensa cruel que espremeu o sangue de vossas sagradas veias. Não foram tão cruéis os carrascos, não foram tão atrozes os flagelos, os espinhos, a cruz, como o foram os meus pecados, ó meu doce Salvador, que tanto vos afligiram no horto.

Achando-vos num estado de grande aflição, eu ainda me prestei a atormentar-vos e muito com o peso de minhas culpas. Se eu tivesse pecado menos, vós teríeis padecido menos. Eis aí a paga que eu vos dei por vosso amor, que quis morrer por mim, ajuntando penas às vossas penas. Meu amado Senhor, eu me arrependo de vos haver ofendido; pesa-me disso, mas esta minha dor é mui pequena. Desejaria uma dor que me tirasse a vida. Eia, pois, por aquela agonia tão amarga que sofrestes no horto, fazei-me participar da aversão que tivestes dos meus pecados. E se então eu vos afligi com as minhas ingratidões, fazei que agora eu vos amo de todo o meu coração, eu vos amo mais do que a mim mesmo e por vosso amor renuncio a todos os prazeres e bens da terra. Vós só sois e sereis sempre o meu único bem, meu único amor.