segunda-feira, 17 de outubro de 2022

Concílio Ecumênico de Trento - Todo católico deve conhecer

Sessão XIV (25-11-1551)

Cap. 4. — A contrição

897. A contrição, que tem o primeiro lugar entre os mencionados atos do penitente, é uma dor da alma e detestação do pecado cometido, com propósito de não tornar a pecar. Este movimento de contrição foi necessário em todo tempo para se alcançar o perdão dos pecados. No homem que cai depois do Batismo, ela é como que uma preparação para a remissão dos pecados, se estiver unida à confiança na divina misericórdia e ao propósito de executar tudo o mais que se requer para receber devidamente este sacramento. Declara, pois, o santo Concilio que esta contrição encerra não só o deixar de pecar e o propósito, bem como o começo de uma nova vida, mas também o ódio da vida passada, conforme as palavras: Lançai de vós todas as vossas maldades, em que prevaricastes, e fazei em vós um coração novo e um espirito novo (Ez 18, 31). E por certo, quem tiver considerado aqueles clamores dos santos: Contra vós só pequei e fiz o mal na vossa, presença (Sl 50, 6); estou esgotado à força de tanto gemer, rego o meu leito com lágrimas todas as noites (Sl 6, 7); passarei em revista todos os meus anos na vossa presença entre amarguras de minha alma (Is 38, 15) e outros deste gênero, facilmente entenderá que eles procediam de um ódio veemente da vida passada e de grande detestação dos pecados.

898. [O santo Concílio] ainda ensina que, embora algumas vezes suceda ser esta contrição perfeita por força da caridade, e reconciliar o homem com Deus, antes que seja realmente recebido este santo sacramento, contudo não se deve atribuir esta reconciliação à contrição somente, independente do desejo de receber o sacramento, que aliás está contido nela. Quanto àquela contrição imperfeita [cân. 5], chamada atrição, porque nasce ordinariamente da consideração da torpeza do pecado ou do temor do inferno e dos castigos, se com a esperança do perdão excluir a vontade de pecar, [o santo Concílio] declara que ela não somente não faz o homem mais pecador e hipócrita, mas ainda que é dom de Deus e moção do Espírito Santo, que verdadeiramente ainda não habita no homem penitente, mas que somente o move; e ajudado por ele o penitente se dispõe a alcançar a amizade de Deus no sacramento da Penitência. Porquanto, abalados por este temor salutar, os ninivitas fizeram penitência na pregação de Jonas, cheia de terrores, e alcançaram a misericórdia do Senhor (cfr. Jon 3). Por isso é com falsidade que certa gente acusa os autores católicos como se tivessem escrito que o sacramento da Penitência confere a graça sem nenhum movimento bom por parte daqueles que o recebem: o que a Igreja de Deus jamais ensinou nem creu. Mas também é falsa a afirmação de que a contrição é extorquida e forçada, e não livre e voluntária [cân. 6].

Cap. 5. — A confissão

899. Em conseqüência da instituição do sacramento da Penitência, que já foi explicada, a Igreja toda sempre entendeu que a confissão íntegra dos pecados fora também instituída pelo Senhor (Tg 5, 16; l Jo l, 9; Lc 17, 14). Esta confissão é necessária por direito divino a todos os que caem depois do Batismo [cân. 7], porque Nosso Senhor Jesus Cristo, antes de sua ascensão aos céus, deixou os sacerdotes como vigários seus (Mt 16, 19; 18, 18; Jo 20, 23), como presidentes e juizes a quem devem ser confiados todos os pecados mortais, em que os fiéis houverem caído. E devem em virtude do poder das chaves de perdoar ou reter pecados, pronunciar a sentença. Pois é claro que os sacerdotes não poderiam exercer esta sua jurisdição sem o conhecimento de causa, nem guardar equidade na imposição das penas, se os penitentes declarassem só genericamente, e não específica e detalhadamente os pecados. Daí segue que os penitentes devem dizer e declarar na confissão todos os pecados mortais de que se sentirem culpados, depois de feito um diligente exame de consciência, ainda que sejam os mais ocultos e cometidos somente contra os dois últimos preceitos do decálogo (Ex 20, 17; Mt 5, 28). Estes, muitas vezes, ferem mais gravemente a alma e são mais perigosos do que os cometidos abertamente. Os veniais, pelos quais não somos excluídos da graça de Deus, e nos quais freqüentemente caímos, posto que com retidão e utilidade, e sem qualquer presunção se digam na confissão [cân. 7], como mostra a praxe de pessoas tementes a Deus, todavia podem ser calados sem culpa e expiados por muitos outros meios. Mas como todos os pecados mortais, mesmo os de pensamento, tornam os homens filhos da ira (Ef 2, 3) e inimigos de Deus, é necessário buscar em Deus o perdão de todos os pecados por meio de uma confissão sincera e humilde. Assim, quando os fiéis de Cristo se esforçam por confessar todos os pecados que lhes vêm à memória, certamente os expõem à divina misericórdia para que os perdoe [cân. 7]. E os que fazem o contrário e calam alguns voluntariamente, nada expõem à bondade divina que possa ser absolvido pelo sacerdote. Pois, "se o enfermo se envergonha de mostrar a chaga ao médico, a perícia deste não poderá curar aquilo que ignora"12. Ainda se colige que é necessário também explicar na confissão aquelas circunstâncias que mudam a espécie do pecado, porque sem elas os pecados não são cabalmente apresentados pelo penitente, nem suficientemente conhecidos aos juizes para fazerem uma apreciação justa sobre a gravidade dos pecados, e para impor ao penitente uma pena proporcionada. Por isso é alheio à razão ensinar que estas circunstâncias foram inventadas por homens ociosos, ou que se há de confessar uma só circunstância, isto é que se pecou contra seu irmão.

900. Mas também é ímpio dizer-se que a confissão, de certo modo, tal como é mandada, se torna impossível [cân. 8], ou chamá-la martírio das consciências. É, outrossim, constante na Igreja [o costume de] não se exigir outra coisa dos penitentes, senão que, depois de se ter cada qual examinado com diligência e perscrutado todos os recessos e esconderijos da consciência, confesse aqueles pecados de que se puder lembrar de ter ofendido mortalmente a seu Senhor e Deus. Quanto aos outros pecados, que não vêm à mente de quem fez esta diligente consideração, se entendem geralmente incluídos na mesma confissão. E é por estes que nós confiadamente dizemos com o Profeta: Purificai-me, Senhor, de meus delitos ocultos (Sl 18, 13). Quanto à dificuldade de semelhante confissão e à vergonha de revelar os pecados, poderia parecer um jugo assaz pesado, caso não fosse aliviado por tantas e tão grandes vantagens e consolações, que recebem indubitavelmente pela absolvição todos que se achegam dignamente deste sacramento.

901. De resto, quanto ao modo de se confessar secretamente só ao sacerdote, posto que Cristo não proibiu que alguém pudesse, para sua própria humilhação, para se vingar ele mesmo dos seus pecados, confessá-los publicamente, tendo como razões dar bom exemplo aos outros ou causar edificação à Igreja por ele ofendida, isto, porém, não foi mandado por preceito divino; nem seria prudente prescrever-se por uma lei meramente humana que os pecados, particularmente os ocultos, fossem revelados por uma confissão pública [cân. 6]. Por isso, e mais ainda pelo consenso geral e unânime de todos os Santos Padres e dos mais antigos, que sempre têm autorizado a confissão secreta, da qual a Santa Igreja tem feito uso desde o começo, e que ainda hoje em dia emprega, viu-se assim evidentemente refutada a vã calúnia dos que têm a temeridade de propalar não ser ela mais que uma invenção humana, alheia ao mandamento divino, e que teve início no Concílio Lateranense por permissão dos Padres ali reunidos. Pois a Igreja no Concílio Lateranense não estabeleceu o preceito da confissão para os fiéis, sabendo bem que já havia sido estabelecido e que era necessário por direito divino; ela ordenou somente que todos e cada um dos fiéis, ao chegarem ao uso da razão, satisfizessem ao preceito da confissão ao menos uma vez por ano. Donde vem que na Igreja de Deus se observa este costume salutar, com grande proveito para as almas fiéis, de se confessarem especialmente no santo e favorável tempo da Quaresma. O santo Concilio aprova inteiramente este costume, aceita-o e o abraça como piedoso e digno de ser conservado [cân. 8].

(12) S. Jerônimo, In Eccl. comm. 10, 11 (PL 23, 1096).

Cap. 6. — O ministro deste sacramento e a absolvição

902. A respeito do ministro deste sacramento, o santo Concílio declara como falsas e inteiramente alheias à verdade do Evangelho todas as doutrinas que perniciosamente estendem o ministério das chaves a todos os outros homens, além dos bispos e sacerdotes [cân. 10] e supõem, contra a instituição deste sacramento, que aquelas palavras do Senhor: Tudo o que ligardes sobre a terra, será também ligado no céu; e tudo o que desligardes sobre a terra será também desligado no céu (Mt 18, 18), e: àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados; a quem os retiverdes ser-lhes-ão retidos (Jo 20, 23), foram dirigidas sem diferença alguma a todos os fiéis de Cristo, de modo que qualquer pessoa teria o poder de perdoar pecados: os públicos, pela correção, se o repreendido se acomodar; os ocultos, pela confissão espontânea, feita a qualquer indivíduo. Declara também que os sacerdotes, mesmo que estejam em pecado mortal, não deixam de perdoar pecados na qualidade de ministros de Jesus Cristo, por causa da força do Espírito Santo, que eles recebem na ordenação; e que pensam de modo errado os que afirmam que os maus sacerdotes perdem aquele poder. Embora a absolvição do sacerdote seja uma concessão de um benefício alheio, contudo não é um simples ministério de anunciar o Evangelho, ou de declarar que os pecados foram perdoados, mas é uma espécie de ato judicial (ad instar actus iudicialis) pelo qual o sacerdote, como juiz, pronuncia a sentença [cân. 9]. Por este motivo o penitente não se deve lisonjear tanto nem confiar de tal modo em sua fé, que chegue a pensar ser verdadeiramente absolvido diante de Deus, mesmo que não haja contrição de sua parte, nem intenção por parte do sacerdote de agir seriamente e de absolver verdadeiramente. Pois a fé sem a penitência não produz a remissão dos pecados; e [pode-se dizer que] seria extremamente negligente de sua salvação quem, percebendo que um sacerdote o absolvesse por mofa, deixasse de procurar com cuidado outro que agisse com seriedade.

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