Sessão XXI (16-7-1562)
Doutrina da comunhão sob ambas as espécies e das crianças
Introdução
929a. Visto que, por arte do maléfico demônio, se espalham por diversos lugares vários erros monstruosos a respeito do tremendo e santíssimo sacramento da Eucaristia, tendo como consequência em muitas províncias o afastamento da fé e da obediência à Igreja Católica, o sacrossanto Concílio Ecumênico Geral de Trento... Julgou dever expor o que a seguir se diz a respeito da comunhão sob as duas espécies e das crianças. Por este motivo proíbe, depois disso, a todos os fiéis cristãos crer, ensinar ou pregar algo diverso do que vem explicado e definido nestes decretos.
Cap. 1.— Que os leigos e clérigos que não celebram não estão obrigados, por direito divino, a comungar sob as duas espécies
930. Portanto, o mesmo santo Concílio, instruído pelo Espírito Santo, que é o Espírito da sabedoria e do entendimento, o espirito do conselho e da piedade (Is 11, 2) e seguindo o juízo e o costume da mesma Igreja, declara e ensina que os leigos e clérigos que não celebram, por nenhum preceito divino estão obrigados a receber o sacramento da Eucaristia sob ambas as espécies, e que, salva a fé, de nenhum modo se pode duvidar que a comunhão debaixo de uma [só] das espécies lhes baste para a salvação. Portanto, ainda que Cristo Senhor Nosso na última ceia tenha instituído este sacramento sob as espécies de pão e de vinho e o tenha distribuído assim aos Apóstolos (cfr. Mt 26, 26 ss; Mc 14, 22 ss; Lc 22, 19 s; l Cor 11, 24 s), contudo aquela instituição e tradição não pretendem que todos os fiéis de Cristo, por preceito do Senhor, estejam obrigados a receber ambas as espécies [cân. l e 2]. Nem tão pouco se deve concluir daquele sermão que se encontra no capitulo 6 de S. João, que o Senhor ordenou a comunhão de uma e outra espécie, de qualquer modo que se entenda [o dito texto], conforme as várias interpretações dos Padres e Doutores. Pois aquele que disse: Se não comerdes a carne do Filho do homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós (Jo 6, 54), disse também: Se alguém comer deste pão, viverá eternamente (Jo 6, 52). E aquele que disse: O que come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna (Jo 6, 55), disse também: O pão que eu darei é a minha carne pela vida do mundo (Jo 6, 52). E enfim, aquele que disse: O que come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele (Jo 6, 57), disse outrossim: Quem come este pão viverá eternamente (Jo 6, 59).
Cap. 2. — O poder da Igreja de administrar este sacramento
931. Declara mais [este sagrado Concílio] que a Igreja sempre teve o poder de, ao administrar os sacramentos, determinar e mudar, salva [sempre] a sua substância, o que julgar conveniente à utilidade dos que os recebem e à veneração dos mesmos sacramentos, conforme a variedade dos tempos e lugares. Isto parece ter insinuado claramente o Apóstolo com estas palavras: Assim nos considere o homem como ministros de Cristo e dispenseiros dos mistérios de Deus (l Cor 4, l). E consta claramente que ele mesmo usou deste poder, tanto em relação a este sacramento, como em se tratando de muitas outras coisas, pois, após ordenar algumas coisas a respeito de seu uso, diz: O resto disporei quando vier (l Cor l, 34). Por este motivo, conhecendo a santa madre Igreja: a sua autoridade na administração dos sacramentos, muito embora no princípio da religião cristã fosse não pouco frequente o uso de ambas as espécies, contudo, tendo-se mudado muito aquele costume com o correr dos tempos, movida por graves e justas causas, aprovou este costume de comungar sob uma só espécie, e decretou tivesse isso valor de lei, a qual não é lícito reprovar nem alterar sem autoridade da mesma Igreja [cân. 2].
Cap. 3. — Que Cristo se recebe todo e inteiro, como verdadeiro sacramento, sob qualquer das espécies
932. Declara ainda que, posto que o nosso Redentor, como ficou dito, instituiu na última ceia este sacramento e o deu aos Apóstolos sob as duas espécies, contudo devemos confessar que debaixo de cada uma delas se recebe Cristo todo inteiro e como verdadeiro sacramento. E que por isso, no que concerne aos frutos, de nenhuma graça necessária para a salvação ficam privados os que recebem uma [só] espécie [cân. 3].
Cap. 4. — Que as crianças não estão obrigadas à comunhão sacramental
933. Finalmente, o mesmo santo Concílio ensina que as crianças que carecem do uso da razão, por nenhuma necessidade estão obrigadas à comunhão sacramental da Eucaristia [cân. 4], porquanto, estando regeneradas e incorporadas em Cristo pelo lavacro do Batismo (Tito 3, 5), não podem naquela idade perder a graça de filhos de Deus, que já adquiriram. Mas nem por isso se deve condenar os antigos por terem observado este costume em alguns lugares. Sem controvérsia se deve crer que, se aqueles Padres Santíssimos tiveram causa racional de obrar assim, conforme as condições daqueles tempos, certamente não o fizeram por entenderem ser isso necessário para a salvação.
Cânones sobre a comunhão sob ambas as espécies e das crianças
934. Cân. 1. Se alguém disser que todos e cada um dos fiéis de Cristo, por preceito de Deus e necessidade de salvação, devem receber ambas as espécies do santíssimo sacramento da Eucaristia — seja excomungado [cfr. n° 930].
935. Cân. 2. Se alguém disser que a Santa Igreja Católica não foi movida por causas e razões justas ao decretar que os leigos e também os clérigos que não celebram comunguem somente sob a espécie de pão, ou que a Igreja errou, assim fazendo — seja excomungado [cfr. n° 931].
936. Cân. 3. Se alguém negar que Cristo, fonte e autor de todas as graças, é recebido todo e inteiro sob a única espécie de pão, porque, como muitos falsamente afirmam, não se receberia conforme a instituição de Cristo debaixo de ambas as espécies — seja excomungado [cfr. n° 930, 932].
937. Cân. 4. Se alguém disser que a comunhão da Eucaristia é necessária às crianças, antes de chegarem ao uso da razão — seja excomungado [cfr. n° 933].
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